Não há quem nunca tenha visto a épica comédia natalícia Sozinho em Casa, um filme em que os McCallister vão de viagem e se esquecem em casa do seu filho Kevin, de oito anos de idade, que acaba a viver uma aventura a proteger a casa da família que dele se esqueceu. Vemos o filme e, apesar de tudo terminar bem, ficamos do lado dos apoiantes do miúdo contra os pais. Afinal, não podia ter acontecido coisa pior do que esquecer um filho. Ou pode? Claro que pode! Pior do que esquecer um, seria terem-se esquecido de dois.
O que eu quero dizer é que é preciso compreender o lado dos pais nestas épocas. Tudo pode acontecer com os miúdos em acção durante as férias escolares. O Kevin McCallister ficou em casa esquecido, mas se tem ido com os pais podia, como muitos fazem nessa idade, fazer aquela cara impossível de aturar quando a única coisa que os pais querem é tirar uma fotografia positiva e cheia de alegria de uma família unida e maravilhosa. Também aqui, pior do que um miúdo sem espírito fotográfico, só mesmo dois, um com má cara e outro a fugir da foto e do aconchego do abraço dos pais, que podem ficar na foto com aquele ar de quem está a pensar “o que é que eu fiz da minha vida?”. Colocam a fotografia no Facebook e o primeiro comentário de um amigo é: “devias era ter-te esquecido deles, como naquele filme…”.
Se houver viagem pelo meio, então o risco de as coisas correrem mal sobe exponencialmente. Ou o avião atrasa, ou o carro não pega por causa do frio que, por sua vez, ataca os miúdos que despiram os agasalhos apesar dos avisos e acabaram por ficar doentes com febre. Se tivessem permanecido no quentinho em casa, nada teria acontecido. Pelo menos, e de certeza, as malas não teriam sido perdidas no aeroporto e ninguém teria ficado à mercê da humilhação de ter de vestir as roupas da sua juventude que a mãe guardou religiosamente, que nunca quisemos vestir e nas quais hoje nem sequer cabemos sem rasgar as costuras.
Mas, enfim, cá estamos para as prendas dos miúdos. Damos-lhes tudo, do bom e do melhor e mesmo assim eles refilam. Como é possível? Alguns odeiam as prendas e esperneiam no chão, outros torturam os irmãos, mais velhos ou mais novos, e há até os que odeiam o próprio Pai Natal. Não há limites para o descontentamento de uma criança. Com a energia própria de toneladas de açúcar, eles não ficam quietos nem por um segundo, sempre a gritar pelos pais, a desobedecer-lhes e a fugir desalmadamente sabe-se lá do quê. Os vómitos e os desarranjos ajudam à festa, principalmente quando não há mudas de roupa porque as malas ficaram perdidas no aeroporto.
É por isso quase impossível não gostar do filme Sozinho em Casa. No fim, sentimos um alívio, idêntico ao que a tantos de nós é proporcionado pela acção dos avós, esses super heróis que têm os remédios para curar os putos, a paciência para os aturar com um sorriso inesgotável e, se for preciso, ainda vão buscar os netos onde quer que estejam para que ninguém fique esquecido nesta época familiar. A todos os avós que garantem que Sozinho em Casa não passa de um filme, obrigado!