Opinião: Caridade ou cumprimento de direitos fundamentais?

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Francisco Queirós

Ah, pois é! O país indignou-se com o que foi divulgado em relação a fortes suspeitas de uso em proveito pessoal de dinheiros públicos e resultantes de donativos solidários pela presidente da Associação Raríssimas.

O revelado quanto aos elevados vencimentos e subsídios auferidos, a pagamentos com dinheiros da associação de despesas pessoais em vestuário, na prestação de pagamento de automóvel, em refeições e deslocações fictícias ou várias mordomias deixou o país revoltado. Como pode alguém desviar subsídios do Estado e utilizar em seu benefício pessoal verbas provenientes de doações e campanhas solidárias destinadas ao apoio de crianças com doenças raras? Qual o envolvimento em tudo isto de várias outras personalidades e responsáveis políticos?

Tudo isto tem de ser investigado. Mas a questão de fundo é outra. Porque é que o Estado, logo nós todos, atribui verbas de quase um milhão de euros num só ano a esta associação? E a que outras? Que fiscalização e com que rigor e transparência se faz sobre esses apoios? Acima de tudo a quem compete garantir cuidados de saúde e de bem-estar? Ora, os governos têm transferido para terceiros responsabilidades que são e devem ser assumidas pelo próprio Estado. E aqui é que está a questão central.

A melhor forma de defender os direitos dos cidadãos é fortalecer os serviços públicos. Supletivamente, onde o Estado não possa ainda chegar que se apoiem programas e projectos de rigor e permanentemente sindicáveis. Que se prestem contas rigorosas.
Mas o que acontece? Transformam-se direitos fundamentais, constitucionalmente consagrados, em áreas de negócio. Direitos? não! Que horror! Caridadezinha! Afinal ainda somos um país de boa gente! Uma esmola aqui, desde que não seja pró vinho ou prás drogas.

E se há fome, em vez de se procurarem soluções conjugadas de promoção de desenvolvimento económico com justa repartição de riqueza e apoios sociais que a minimizem, bota lá mais caridadezinha. Um quilito de arroz até um pobre dá a outro pobre, caramba! Apela-se ao bom coração de todos e incentiva-se a esmola.

Criam-se dias próprios para campanhas de matar a fome aos pobres. Tu dás um pacote de arroz que compras no hipermercado. Já tu compras azeite no híper. E ela e ela compram massa e salsichas. Sempre no hipermercado. Contribuindo para aumentar os lucros dos proprietários do hipermercado. Será que estes entregam esses elevados lucros a instituições? Pois…

assim, e se os produtos recolhidos não se perderem pelo caminho – os caminhos da caridade são também por vezes sinuosos – lá se mata a fome a uns quantos por alguns dias e vivemos mais felizes.

Ora, na saúde, na educação, na segurança social, no apoio a pessoas com deficiências ou a idosos será o mesmo. Que o Estado não tem vocação para isto e para aquilo. Só para polícia e tropa, e por enquanto…Que a sociedade civil faz melhor…

O Estado que assume a sua responsabilidade. Que garanta os direitos fundamentais de todos os cidadãos e estaremos muito menos preocupados com os desvios e os usos indevidos de bens públicos por certas madamas e outros chicos-espertos.

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