Sempre houve necessidade de uma reforma agrária que fosse a ruptura salvadora de um espaço rural esclerosado e gerador de miséria. Era esta construída para manter tudo na mesma para tranquilidade de uns senhores da terra. Eram todos eles apostados num “dolce fare niente”. Também “Salazar, então professor em Coimbra, reconheceu que, “se os direitos foram proteção, pagaram-na os consumidores”. Assim, falava-se de fome em Portugal no ano de guerra de 1915.” ( 1 )
Mas, em Portugal, apesar de tanto gente douta, sempre se falou de fome e miséria como inevitável até que os pobres camponeses fizeram o seu grande salto em frente para França, começando assim a desertificação do Interior, assim reduzido a novo espaço colonial do Litoral Português.
Salazar e os seus seguidores ainda se preocuparam em colonizar alguns baldios ou herdades, que tinham herdado como foi o caso de Pegões, mas pouco se preocuparam em lhes dar condições de sustentabilidade, que permitissem quebrar as fracas condições de produtividade que então impediam a elevação dos salários e rendimentos dos que trabalhavam a terra.
Mais tarde, os que combateram a reforma agrária provisoriamente permitida pela Revolução de Abril também pouco se preocuparam em criar alternativas que desenvolvessem a agricultura portuguesa. Desprezaram e obstaculizaram até a agricultura familiar e esta foi definhando. Construíram assim um espaço rural desertificado, cheio de velhos, muitos deles regressados dos centros urbanos. Era para onde tinham emigrado em busca de condições de vida que o uso das terras herdadas não lhe permitiam.
Entretanto, os poderes mediáticos, inspirados ou talvez só serventuários do nosso poder pouco esclarecido, foram propagandeando que a saída para o mundo rural estava na florestação das terras assim abandonadas. E como o nosso poder governativo não pensa, e só macaqueia e imita os saberes doutros lugares, sempre como algo que não analisa e por isso não adapta adequadamente ao mundo rural português.
Esvaziando o Estado para o tornar mínimo, os partidos da governação foram abandonando o Interior a si próprio, impedindo até com portagens abstrusas e caras que os seus emigrantes no Litoral o possam visitar e cuidar. Foi assim que criaram nele o espaço que iria arder quando a seca e o verão prolongado o propiciasse.
Como a culpa morreu sempre solteira, os causadores deste criminoso desleixo, vêm agora clamar contra o Estado, culpando-o de todos os males que vemos acontecer, procurando que este pague agora todos os prejuízos que a sua continuada ação governativa originou agora ao Interior.
Nem sequer por isso analisam onde ocorreram as falhas.
Prosseguem apenas a sua política vesga que nunca faz o necessário ato de contrição para que no presente deixem de pecar.
( 1 ) Vítor de Sá – Projectos de reforma agrária na I República in Análise Social, vol. XIX ( 77-78-79 ), 1983-3.°, 4.° 5.°, 597-598.