Opinião – Se o carro der problemas, “empandeire-o de imediato”

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Mário Frota

Se o carro novo lhe der problemas, não deixe que o reparem. Não ceda nem confie no concessionário da marca. Exija logo, sem contemplações, ou a substituição por novo ou o fim do contrato com a devolução do veículo e a restituição do preço. Sem tirar nem pôr.
Para que, em caso de litígio a dirimir nos tribunais, não tenha de se haver com uma decisão surpreendente, que em tudo o prejudique.
Vem isto a propósito da recusa do Jumbo Cascais em aceitar, no exercício do seu direito de garantia, a reclamada substituição de um mini-forno ali adquirido, por se ter verificado a sua inoperacionalidade no dia imediato ao da compra, aquando da segunda utilização.
Convém nos debrucemos sobre uma decisão do Supremo Tribunal de Justiça (Cons.ª Maria da Graça Trigo) lavrada a 17 de Dezembro de 2015, em litígio cujo bem em discussão era ainda mais valioso: um Mercedes-Benz modelo C250 CDI, Station Bluefficienc “novinho em folha”.
A adquirente do veículo, em vez de exigir logo a substituição ou a extinção do contrato, contemporizou, foi aceitando as reparações e acabou por se… “tramar” (passe a expressão)!
Eis o teor da decisão do nosso mais alto tribunal:
“I – Aquilo que no regime legal que regula a venda de bens de consumo (DL n.º 67/2003, de 08-04, alterado pelo DL n.º 84/2008, de 21-05 ) se designa como falta de conformidade com o contrato corresponde à noção tradicional de defeitos do bem.
II – A colocação de um veículo na oficina ou oficinas autorizadas da rede da marca do automóvel constitui um facto concludente que permite deduzir a vontade de exigir a reparação dos defeitos “sem encargos”, faculdade que é atribuída pelo art.º 4.º, n.º 1, do DL n.º 67/2003, em alternativa à possibilidade de exigir a substituição do bem, ou a redução do preço, ou a resolução [extinção] do contrato.
III – Tendo a autora optado pelo direito à reparação do veículo automóvel, não goza mais do direito a invocar tais defeitos ou a falta de conformidade do bem como fundamento para exigir a substituição do automóvel, qualquer que seja o momento que se considere.
IV – Efectuadas sucessivas reparações no veículo e tendo o respectivo custo sido suportado pela ré representante da marca, os direitos da autora encontram-se extintos não por caducidade mas pelo cumprimento.
V – Pretendendo a autora preservar a faculdade de exigir a substituição do veículo por outro equivalente, não podia tê-lo entregue em oficina autorizada da rede da marca do automóvel; ou, tendo-o feito, cabia-lhe ter feito prova de que a reparação fora feita contra sua vontade e de que, aquando da recepção do automóvel, informara as rés de que não prescindia da faculdade de, em alternativa, à reparação do bem, optar por um dos três direitos que o art.º 4.º, n.º 1, do DL n.º 67/2003, prevê [substituição, redução adequada do preço ou devolução da coisa com a restituição do preço pago].”
No caso, a consumidora foi vítima da sua boa-fé. A deslealdade triunfou. Já que a marca ficou ao alto, nesta aparente venda, afinal, de coisa nova carregada de “defeitos”!
A última parte do sumário é esclarecedora:
Cabia à compradora provar que a reparação se fizera contra sua vontade e que, quando recebeu o automóvel, informara [a Mercedes] de que não prescindia da faculdade de, em alternativa, à reparação do bem, optar ou pela substituição ou pela extinção do contrato…
Para que conste! Que decisões do jaez destas dão forma aos direitos!

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