Opinião: As precariedades laborais

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José Augusto Ferreira da Silva

A legislação laboral portuguesa foi durante décadas acusada de ser muito rígida dificultando o investimento e a criação de emprego. A ideia de que era legítimo ter a expetativa de um emprego duradouro e com condições de estabilidade, depreciativamente chamado de “emprego para a vida” foi fustigada por todo o tipo de conservadores e muito especialmente pelos neoliberais. O mesmo com os denominados “direitos adquiridos”.

Em 2003, pretextando a codificação da legislação laboral, que era dispersa, o governo de então introduziu diversas alterações legislativas guiadas pela ideia da flexibilização que mais não trouxeram do que cortes significativos aos direitos dos trabalhadores. Ao previsível e verificado aumento de desemprego argumentavam os responsáveis de então com o chavão da “flexigurança”, ou seja, com a ideia luminosa de que haveria maior desemprego, sim, mas com garantia de apoio social que permitiria superar as dificuldades dali decorrentes. Rapidamente a miragem se desvaneceu, indo-se a segurança e ficando apenas a flexibilização! Ainda não satisfeitos com a retirada de direitos efetuada até aí, chegou o Código de Trabalho de 2009, e alterações subsequentes, com retrocesso significativo em aspetos centrais dos direitos laborais: flexibilidade dos horários de trabalho, banco de horas, diminuição de retribuições de trabalho suplementar, maior facilidade na contratação a termo, maior facilidade nos despedimentos coletivos, por extinção de posto de trabalho e por inadaptação, diminuição das indemnizações, maiores dificuldades à contratação coletiva. A legislação produzida pelo Governo Passos Coelho foi quanto a isso exemplar pela subserviência aos interesses de alguns setores empresariais mais retrógrados e respetivas associações patronais e pelo total desrespeito aos trabalhadores e associações sindicais.

Assiste-se, hoje, em consequência disso, a uma atuação despudorada no que respeita aos despedimentos coletivos e por extinção de posto de trabalho. Sendo, supostamente, difícil despedir um trabalhador por justa causa, já despedir pelas outras formas é o mais fácil que se possa imaginar. E, na maioria das vezes, pressionados os trabalhadores, estes acabam a revogar contrato por mútuo acordo, como se essa fosse a sua vontade real! Com a complacência absoluta do Ministério do Emprego que não exerce minimamente o seu papel fiscalizador, limitando-se a assistir passivamente mau grado a sobrecarga que tais condutas acarretam para o orçamento da Segurança Social; e também com a jurisprudência dos nossos tribunais centrada na ideia da autonomia da gestão empresarial e que não exerce um controlo jurisdicional efetivo desencorajador dos abusos. E para além de ser muito fácil despedir é muito barato fazê-lo. E despedido um trabalhador com um salário médio de 1000/ 1200 euros, logo se contrata outro, para preencher o posto de trabalho por… metade do preço. Por isso não se estranha que, apesar do aumento do salário mínimo, o nosso salário médio vá emagrecendo e nos afaste cada vez mais da média da UE.

E daí que, a acrescer à tradicional precariedade laboral decorrente da contratação a termo ou a “recibos verdes” que incide, sobretudo, sobre os jovens que entram no mercado de trabalho, haja cada vez mais uma precariedade que afeta a generalidade dos trabalhadores que sentem, no dia a dia, a ameaça de perder o seu posto de trabalho, por motivo nenhum… e, por regra, em idade que já lhes não permite entrar, novamente, no mercado de trabalho. Com a desorganização de vida decorrente da situação de desemprego, não só no aspeto económico mas, essencialmente, no da sua integração social e familiar e na sua dignidade. As manobras que estão a ser levadas a cabo pela Altice/Meo/PT para se ver livre de cerca de 3000 trabalhadores devem merecer o nosso mais vivo repúdio.

Impunha-se, pois, que o Governo da “geringonça” tomasse medidas efetivas para a reposição de padrões de proteção do trabalho e do emprego geradores de segurança e de aumento do rendimento dos trabalhadores, a acompanhar o bom desempenho da economia. De modo a que, quem contribui com o seu trabalho esforçado possa beneficiar desse esforço. Mas, neste aspeto, aos costumes o Governo diz nada…

 

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