Opinião: Qual o preço das freguesias?

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Francisco Queirós

O governo de Paulo Portas e Passos Coelho encetou uma ofensiva feroz contra o poder local. Aliás, não foram únicos. Restringir a autonomia administrativa e financeira das autarquias é um objectivo antigo, a que o governo PSD/CDS-PP deu um novo fôlego.

O projecto de subversão do poder local foi então baptizado com uma muito cínica expressão, “reforma da administração local”. De facto, constituiu a assunção de um outro poder local, empobrecido na sua dimensão democrática, atingido no exercício das suas atribuições e competências, limitado nos meios e recursos capazes de assegurar a resposta às aspirações e interesses da população.

O processo de agregação/extinção de centenas de freguesias concretizou-se com a lei nº 11-A/2013, inserido nesse objectivo mais amplo de liquidação do poder local democrático, conquista do 25 de Abril, consagrado na Constituição da República Portuguesa.

Com o pretexto das imposições do memorando da Troika, o governo de então anunciava que tais medidas resultariam em diminuição de despesa pública, à semelhança do que viria a suceder com os demais serviços públicos. Escondia, porém, que por detrás destas medidas estava um plano mais geral de reconfiguração do Estado, com redução do número de trabalhadores e a concentração e centralização de serviços públicos.

A liquidação das freguesias acarretou perda de identidade adquirida e consolidada ao longo de gerações, muitas décadas ou séculos. A extinção e fusão de freguesias provocaram a diminuição da proximidade entre os cidadãos e a “res publica”, o Estado, o maior afastamento entre eleitores e eleitos.

Esta medida provocou a eliminação de milhares de eleitos autárquicos, mais de vinte mil eleitos foram dispensados, reduzindo-se por esta via a participação popular no governo dos destinos das freguesias do país. Foi ainda destruído emprego público. Aumentaram sim, ao invés, as dificuldades na resposta aos problemas e anseios das populações.

Ao contrário do que muitas vezes foi repetido, a reforma administrativa territorial autárquica não trouxe poupança ao Estado, o que, na verdade, era um falso objectivo com o propósito de ludibriar a população. Pelo contrário, resultou em muitas situações em novos encargos acrescidos para as freguesias. É exactamente esse acréscimo de despesas correntes que 80% das freguesias agora reportam.

Afinal, qual é o preço das freguesias? Quanto custam? Não há contas possíveis. Qual é o valor do cumprimento do seu papel junto das populações? A Constituição da República no artigo 235.º consagra: “ 1. A organização democrática do Estado compreende a existência de autarquias locais. 2. As autarquias locais são pessoas colectivas territoriais dotadas de órgãos representativos, que visam a prossecução de interesses próprios das populações respectivas.”

A prossecução dos interesses próprios das populações através de um poder local democrático forte é essência da nossa democracia. O papel dos eleitos locais é insubstituível para a resolução de problemas e anseios dos cidadãos, para a melhoria da qualidade de vida das populações. As freguesias têm um preço? Pois têm! Incalculável. Insubstituível. Para a construção de um país mais moderno e democrático.

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