Não foi erro ou lapso de linguagem. O presidente do Eurogrupo, ministro holandês das Finanças, disse o que lhe vai na alma. Para Dijsselbloem, os europeus do sul são malandros e irresponsáveis. “Não se pode gastar todo o dinheiro em copos e mulheres e depois pedir ajuda”, declarou o homenzito em entrevista ao jornal alemão “Frankfurter Allgemeine Zeitung”, agradando provavelmente a vários dos seus leitores alemães.
Há muito que se cultiva a tese de que os povos do sul, gregos, italianos, malteses, espanhóis e portugueses, são pouco dados ao trabalho e vivem acima das suas possibilidades. São as cigarras da Europa, enquanto os povos do norte são como formigas laboriosas, cumpridoras escrupulosas de todas as normas. Mais grave ainda é que esta concepção xenófoba tenha tido acolhimento e cultores dentro de portas na era de Passos Coelho. Os portugueses, perdidos pela luxúria, no esbanjamento desmedido, pagaram bem caro os seus pecados e devaneios de ricos – sentenciaram.
O estereótipo, que não encontra base de sustentação real e não tem ou teve tão pouco qualquer comprovação de facto, promove a xenofobia. O sul dos pobres e dos esbanjadores sem tino tinha de se corrigir. O norte não pode continuar a sustentar malandros!
O inadmissível comentário do senhor Dijsselbloem não lhe concederá muita fama. Se mais não for, pela dificuldade prática que afecta os malandros do sul em pronunciar este nome, pouco familiarizados que são, helenos e latinos, com esse idioma bárbaro.
O homem sairá de cena, mas a peçonha permanece.
Os povos do sul gostam de festa, como todos os que apreciam a vida! Recorde-se aqui, porém, ao senhor D. e a outros, que bem ao invés do estereótipo que cultivam, os povos do sul são os que mais trabalham. Segundo dados da própria UE, os gregos trabalharam em média 2042 horas em 2014, os portugueses 1857, os noruegueses 1427, os holandeses 1425 e os alemães 1371 horas. Para a larga maioria dos trabalhadores destes países, não sobra muito tempo para copos e de sobras de dinheiro não se guardará muita memória.
O homenzinho saberá isso. Como sabe que os holandeses gostam tanto de copos como quaisquer outros e já terá ouvido alusões a cidades europeias onde se expõem mulheres nas montras para aluguer sexual.
O homenzinho sabe tudo isso. Na verdade, o que afirma o presidente do Eurogrupo é muito mais que o resultado de uma visão xenófoba e sexista sobre os mestiços do sul. Por detrás da opinião de Dijsselbloem, está uma concepção colonialista e imperial da Europa que se pretende e se crê convictamente superior.
Nessa visão de Europa, os países do sul e do leste, não são mais que periferias, colónias de novo tipo. Afinal, o sul é porreiro para passar férias. Ao sol, nas praias do sul da Europa, pode bem um europeu genuíno, de boa raça, veranear, espreguiçar-se e emborcar uns copos de bom vinho, se possível na companhia de mulheres indígenas ou de homens autóctones.
Nesta União Europeia não surpreende que se menospreze a soberania dos Estados, quando se enxovalha a cultura e a identidade dos povos. Não, senhor Dijsselbloem, não podem os povos ser colonizados! Não se pode submeter os europeus às imposições de uns quantos entes e povos ditos superiores.
E, valha a verdade, já despendi consigo, triste criatura, demasiado tempo! Ora, vamos lá a coisas sérias e brindemos com um bom vinho, contra a arrogância, a xenofobia, o sexismo e o colonialismo imperial!