Opinião – (Des)equilíbrio precário

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Joaquim Amândio Santos

Joaquim Amândio Santos

O modelo social e económico europeu morreu.

Por mais que nos custe e está mesmo a custar.

Por mais que tentemos negar essa evidência, empurrando com a barriga os crescentes problemas do velho continente para um futuro perdido na névoa dos tempos que hão-de vir.

Foi esse modelo que, após a cruel e sangrenta 2ª Grande Guerra Mundial, transformou um continente em ruínas numa das maiores potências económicas do mundo e no espaço continental com melhor qualidade de vida em todo o globo.

Solidez no emprego, acesso praticamente universal aos melhores cuidados de saúde, educação, investigação e conhecimento ao mais alto nível, um culto generalizado do lazer e do bem-estar, paz constante e uma crescente consolidação democrática, baseada numa integração europeia que, dos anos 50 até aos idos finais do século XX, pregou a supremacia inteligente de uma Europa unida, feita com as nações e impedindo os conflitos entre as nações.

Este autêntico Éden dependeu sempre de uma coisa: que o crescimento económico conseguisse manter sempre a capacidade financeira dos estados fornecerem aos cidadãos os serviços cada vez mais sofisticados e abrangentes que, por sua vez, permitiam uma qualidade de vida excecional, baseada numa classe média bem instalada, em índices de pobreza quase marginais e nua redistribuição da riqueza que mantivesse esta nova “pax romana” entre todos.

Por outro lado, o fator individual decisivo para que o modelo funcionasse era a existência de um quase pleno emprego, com salários pelo menos aceitáveis e uma garantia de que a posição laboral se mantivesse até à reforma, na maioria dos casos.

Duas décadas depois, tudo desmoronou.

Estados falidos, reformas e serviços sociais em causa, desemprego crónico galopante, precariedade laboral, empresas descapitalizadas, sistema financeiro e bancário pelas ruas da amargura, numa Europa cada vez mais envelhecida e com taxas de natalidade a anteverem dias ainda mais azedos.

Mesmo assim, não deixa de ser irónico que o continente europeu continue a possuir índices de desenvolvimento e bem-estar quase incomparáveis e que, por isso mesmo, seja o maior ponto de atração para todos os migrantes económicos e para os refugiados de guerra.

Continuamos em paz. Uma paz que só poderá ver o fim se, ao modelo socioeconómico agora em fim de festa, não suceder um modelo que garanta minimamente as condições de vida a que os europeus se habituaram, seja a norte, seja a sul.

E esse novo modelo só poderá ser viável se resolver a questão mais dramática de todas: o emprego.

E os sinais não são nada bons.

Tocam mesmo o alarme total quando olhamos a situação em Portugal.

Afinal é onde vivemos e onde a chaga do desemprego mais nos afeta.

Desde 2015 que o mercado de trabalho voltou a mingar. Desde julho, o emprego medido pelo INE caiu 61 mil vagas e o desemprego tem vindo a ostentar, mês após mês, terríveis frações decimais de crescimento, que são muito mais do que um dado num Excel.

Junte-se a isto a precariedade crescente dos poucos empregos que ainda resistem, os programas ocupacionais do IEFP que fazem sair das estatísticas mais alguns milhares por alguns meses, a quebra de investimento privado e público e lá vamos nós a caminho de mais uma tempestade perfeita.

Uma das muitas que, sobretudo desde 2008, assolam a nossa vida de forma brutal.

Este país, esta Europa, cada vez mais, não são nem para novos, nem para velhos.

A felicidade coletiva já não mora aqui nem deixou destino para onde abalou.

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