Ricardo Castanheira

Só quem ama e desfruta a vida na sua plenitude pode (sem amarras) pensar livremente na eutanásia. Trata-se de viver com a qualidade máxima e o sofrimento mínimo até ao fim. Legítimo e tão simples, assim.

De tempos a tempos, a questão da eutanásia volta à ordem do dia. Regra geral – tal como as demais questões fracturantes (descriminalização do aborto, do consumo de drogas, etc) – apresentada por movimentos de esquerda, a que de imediato se contrapõem protagonistas de direita. E aí começa a demagogia.

A tentação fácil de criar dicotomias entre os defensores da vida e os da morte é tão falsa quanto redutora e perigosa. Ninguém no seu pleno juízo deseja a morte, pelo menos os hedonistas da vida. Ao invés, há os que vêem na morte a redenção ou a passagem para algo (melhor, dizem). Mas não é mesmo disto que se trata. E estas confusões não ajudam ao debate.

Também, não me parece que seja uma questão de natureza ideológica e menos ainda partidária. De igual modo, não é sequer moral, religiosa ou ética. Por muito que alguns pensem que sim. As coisas por vezes são bem mais prosaicas. Tal como o aborto era do domínio da saúde pública e do exercício das liberdades individuais; tal como o debate em torno do consumo de drogas é também de saúde pública e política criminal; a eutanásia é clínica e no domínio das liberdades individuais.

Não se compreende (nem aceita) que, nos tempos atuais, o sofrimento no término da vida fosse uma inevitabilidade. A medicina atingiu níveis de evolução assombrosos e a tecnologia ajuda sociedades e indivíduos, pelo que por termo ao sofrimento (do sujeito e da família) e à lentidão a caminho da morte é um imperativo.

Escutam-se algumas denúncias graves quando se fala de eutanásia – tal como no aborto clandestino e no tráfico de drogas – existem por certo interesses instalados e situações nublosas que não beneficiam a coletividade. Daí a necessidade do debate aberto, inteligente e sereno para mudar, em nome de uma vida com qualidade até ao fim!