Opinião – O acampamento

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João José Pedroso Lima

Não podia deixar de comover o pequeno grupo, a generosidade dos donos da propriedade onde tinham acampado, sem licença, e que lhes mandava, no mesmo dia, um presente de dois grandes cestos com uvas para o jantar. O grupo era constituído por oito jovens colegas de um curso de agronomia da Universidade de Trás os Montes e Alto Douro e a propriedade, uma vasta faixa de terreno situada ao longo da margem Norte do Douro.
Marcos, o chefe do grupo, logo na manhã do dia seguinte, foi à casa da propriedade para pedir desculpa por terem acampado sem pedir licença e agradecer as uvas.
O proprietário era um jovem que não devia  ter  mais de trinta anos. Agradeceu as palavras de Marcos mas disse-lhe que, embora proprietário, em termos oficiais, sempre achara que a terra não era, de facto, de ninguém e que não tinha lá nenhuma tabuleta a proibir o acampamento.
Só pedia é que, depois de terem saído, quando ele fosse ao terreno onde tinham acampado, ficasse com a certeza de que o respeito que ele tinha pela terra, fora compreendido pelo grupo.
Marcos percebeu a mensagem e quando regressou contou a história aos seus companheiros, reforçando a regra de não estragarem nada nem deixarem qualquer lixo no terreno. Mas a atitude do jovem proprietário despertou a admiração de todos do grupo.
Foi então que Marcos teve uma ideia para agradecer ao proprietário de uma forma original e dentro da linha de especialidade do grupo.
– Vamos arranjar oito ciprestes, tantos quanto o pessoal do grupo e plantamo-los ao longo do limite da propriedade, suficientemente espaçados, num local de onde se veja bem. Assim, quando aqui passarmos não nos esquecemos destas férias. Nem o proprietário, disse alguém.
Foram comprar as árvores e plantaram-nas com toda a ciência que já tinham aprendido. Nada disseram ao senhor e, no dia seguinte, deixaram a propriedade e prosseguiram na sua viagem ao longo do rio Douro.
Naturalmente, este acontecimento foi rapidamente esquecido por aquelas cabeças jovens, perante tantas coisas interessantes que se passaram naquelas férias!
Uns dez anos depois, Marcos, agora engenheiro agrónomo, com a sua esposa e dois filhos, num passeio de fim de semana passaram no local. Toda a cena lhe veio à cabeça. Os ciprestes estavam altíssimos, mas, para surpresa de Marcos, não eram oito mas, dezenas deles, ao longo de toda a propriedade. O efeito era excelente e beneficiava muito todo o aspeto.
Marcos contou à esposa, com um certo orgulho, o que se tinha passado, há dez anos atrás, mas viu pela sua reação que havia qualquer coisa que não lhe tinha agradado. Passados uns instantes esta disse: Acho tudo excelente, a ideia ótima, oportuna, etc. Só não gosto é da árvore escolhida. Parece o limite de um cemitério.
Marcos não reagiu logo. Uma crítica com dez anos de atraso já não produz grande efeito, mas acabou por responder, um tanto desiludido: Isso são preconceitos que, naquela altura, já não tínhamos.
Marcos resolveu ir cumprimentar o proprietário da fazenda. Levou algum tempo até encontrá-lo, depois de muitas perguntas para o localizar, na enorme propriedade. Reconheceu Marcos de imediato. Depois dos cumprimentos, mandou chamar a esposa. Sandra era uma senhora alta, bem parecida e de grande simpatia. – Então este é um dos heróis dos ciprestes? Perguntou, efusivamente e ficaram logo todos apresentados. Falaram sobre os seus percursos naqueles anos depois do acampamento e, finalmente, falaram nos ciprestes.
Sabe, disse o proprietário, depois de se terem ido embora quando vi as árvores que plantaram senti uma alegria enorme. Comovi-me mesmo, foi um gesto extraordinário e conto muitas vezes que foi a melhor prenda que alguém alguma vez me deu. Gostei tanto que resolvi limitar toda a propriedade com ciprestes. Agora chamam-lhe a Quinta dos Ciprestes. A vocês o devo.
– Penso que talvez tivesse ficado melhor se se tivessem lembrado de usar outra árvore, o cedro por exemplo, em vez do cipreste, disse a mulher de Marcos, que dificilmente se dá por vencida. Sandra riu-se e disse: Algumas pessoas daqui também disseram isso, defendem que o cipreste simboliza a morte. A simbologia  das coisas, porém, varia com o tempo e local.
Por exemplo o cedro já simbolizou o envelhecimento, pelo menos é o que Eça de Queiroz sugere, nos Maias.
Na Europa antiga, o cipreste símbolizava o duelo e por isso orlava os cemitérios. Na tradição cristã, porém, o cipreste é um símbolo das virtudes espirituais.
Para nós, eu e o meu marido, simboliza as virtudes de um grupo de rapazes bem formados,

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