Opinião – Fábrica de pobres

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Francisco Queirós

Francisco Queirós

Há para aí quem pense que a pobreza é uma chatice. Que ter um pobre de estimação, como quem tem um gato ou um cão a quem se dá caridade, vá que não vá. É até muito útil e auxiliador dos deveres cristãos.

Lobo Antunes descreve bem essa relação das tias com os seus pobres privativos. Mas, de facto a pobreza para além dos limites já é mais que incómoda. Os pobres são uns incapazes, gente sem garra, sem espírito empreendedor e resiliência ou uns oportunistas, uns encostados, os chico-espertos que vivem à custa do Estado, banqueteando-se com as somas pantagruélicas do RSI, lambuzando-se com subsídios de desemprego ou mesmo arrotando de reformas e pensões para as quais descontam os que trabalham, sobretudo os que por destino ou subida a pulso vivem no sucesso e mais dão para essa caridade pública.

A pobreza contida, humilde e resignada, nem traz grande mal ao mundo, acreditam, é da vida. O mal é quando ela incha, engorda, como barriga de fome, e obriga o Estado a despesas sumptuárias, desfeia as paisagens instalando-se em casebres e casinhotos donde brotam ratos e maus cheiros, se passeia pelas cidades, incomodativa nesse hábito pernicioso e doentio de esmolar ou mais ainda quando se torna perigosa, reclamante, exigente ou reivindicativa.

Não, não são raros os que assim pensam. Muito menos os que agem em conformidade. O que dizer das novas medidas orçamentais que reduzem os apoios sociais no momento em que se agudiza a crise social e em que metade dos desempregados não aufere subsídio de desemprego e as restantes prestações sociais apenas permitem uma sobrevivência miserável?

Toca a mexer nas prestações sociais. Para ajudar quem mais precisa? Nada disso! Pelo contrário. Ora, toma! Vives com subsídios à custa dos outros, pois então, vais passar a ter menos! A sopita será mais líquida. Tivesses estudado! Ah, estudaste! Pois bem, tivesses sabido ser empreendedor! A história desta e doutras nações está cheia de vencedores, os que combateram por isso.

Dos fracos não reza a história. E tens sorte! Ainda resta qualquer coisita para ti. O governo, providencial, não te abandona. Dá-te uma esmola! Miudinha. Mas do fundo do coração.

Cabe-te a ti cumprir a tua parte. Patentear com exuberância a tua eterna gratidão e quanto ao mais resignar-te ou como é moda dizer-se demonstrar resiliência. E alegra-te! Afinal, somos um país cada vez mais rico. Em pobres.

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