Opinião – A saúde na urgência

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Norberto Pires

Norberto Pires

Esta semana recorri ao Centro Hospitalar da Universidade de Coimbra (CHUC) para uma emergência, acompanhando um familiar. Durante esse tempo pude observar os serviços e a forma como se lidava com as várias situações que iam aparecendo. Fiquei verdadeiramente impressionado com o que vi. Se os CHUC são o melhor hospital do país, nem quero imaginar como serão os outros, por esse país fora.

A primeira sensação que tive foi a de uma gritante e escandalosa ausência de experiência. A esmagadora maioria, senão totalidade, do pessoal médico é recém-formado e portanto sem a experiência necessária para um serviço de urgência. A triagem foi feita por uma enfermeira. Não compreendo as duas situações. Exigia-se um médico experiente na triagem e a presença visível de pessoal médico experiente acompanhando os mais novos, necessariamente em formação, garantindo uma resposta eficaz às várias situações clínicas.

A segunda sensação que tive foi a de uma grande desorganização, por falta de pessoal, desmotivação, sobrelotação e desorganização. Na verdade vai tudo desaguar aos CHUC, sem o necessário backup de periferia, pelo que, com a gritante falta de recursos, as situações estão já para além do aceitável nas condições oferecidas para tratar com dignidade e cuidado os vários casos. Nota-se o esforço de todos, mas também um enorme cansaço, especialmente de enfermeiros (cujos salários se mantiveram, ou foram reduzidos, aumentando a carga horária).

A terceira sensação que tive foi a de um grande desânimo por parte do pessoal médico, de enfermagem e auxiliar. Falam de cansaço e de vontade de terminar com este pesadelo. E relatam situações verdadeiramente alarmantes atribuindo-as ao desinvestimento público bem evidente.

Como país não estamos a fazer bem. Nada justifica o desinvestimento na saúde dos portugueses. Nada.

Não podemos exigir aos cidadãos esta GIGANTESCA carga de impostos e depois oferecer-lhe serviços de qualidade muito sofrível. Qualidade que resulta de desorganização, não utilização de recursos disponíveis (numa urgência devem estar pessoas jovens e pessoas experientes, complementando-se e permitindo a transferência de experiência), ausência de condições materiais e desrespeito pelos cidadãos.

No final (depois de várias horas numa urgência), paguei quase 50 euros de taxas moderadoras. Imaginei uma pessoa com ordenado mínimo a precisar desta urgência. Isso equivaleria a 10% do seu salário para tratar uma emergência que essa pessoa teria todo o direito, como eu e qualquer outro cidadão nacional, de ver tratada. Fica-me um aperto no coração. Não é este o país que quero.

Confesso o meu total descrédito na política, nos políticos, nos partidos e na forma como estamos a gerir este país. É altura de todos nós percebermos que é necessário adicionar competência, disponibilidade e avaliação a quem gere politicamente os recursos que são de todos. Não sei se é a democracia que não funciona ou se somos nós que não queremos saber em quem votamos e encaramos as eleições como um jogo Benfica-Sporting em que cada um tem o seu clube. Mas não pode ser e não pode continuar.

O que estamos a fazer a este país é inaceitável. Não aceito que se gastem milhares de milhões em coisas de que não precisamos, ou a tapar buracos financeiros resultantes de má-gestão e fraude, e depois se corte na saúde, na educação, na cultura e na segurança-social. O que fizemos, o que insistimos em não resolver por falta de capacidade e de vontade reformadora, é já criminoso.

Por este caminho, com gente dos partidos a aceder a lugares para os quais não está preparada, sem capacidade de colocar os melhores, sem capacidade de exigir muito mais de quem gere os interesses de todos, temo o pior. Aliás O PIOR, o inaceitável (de terceiro mundo), já está a acontecer. Espero que compreendam o meu desânimo e a sensação que tenho, muito forte, de que isto vai correr muito mal.

E não vejo soluções no horizonte. A única que me atrevo a avançar é a de que conseguirmos, todos, debater o país, o que queremos e como nos vamos organizar para o obter. Desta forma, com estes partidos sem capacidade de mudança, com estes políticos sem chama, sem ideias, sem capacidade de reformar, agarrados a ideias feitas que eles próprios não compreendem, centrados nas suas clientelas e jogos partidários, com estas práticas, com este carreirismo inaceitável, com esta incapacidade de atrair os melhores afastando a mediocridade que tomou conta do Estado e dos recursos nacionais, não vamos lá e teremos um colapso em breve.

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