Opinião – Esclarecimento essencial

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Norberto Pires

Norberto Pires

É muito claro que Portugal desperdiçou grande parte dos fundos comunitários estruturais e de coesão que recebeu desde 1989, altura em que entrou ao serviço o 1º Quadro Comunitário de Apoio. Isso foi bem visível na enorme quantidade de empresas, agências de desenvolvimento, associações, etc., que foram criadas propondo todo o tipo de iniciativas e ações, muitas delas sem o mínimo de sentido, e que tinham de facto como único objetivo aceder a fundos comunitários.

Esse dinheiro não era visto como uma oportunidade para projetos estruturantes, pensados e planeados com pés e cabeça, mas antes como uma forma de obter e gastar fundos comunitários constituindo assim uma fonte de financiamento para essas entidades e para os seus promotores. Era uma questão de imaginação e de juntar as pessoas certas para facilitar processos de avaliação, abrir portas e obter colaborações que permitissem garantir o financiamento pretendido; o projeto era só um pretexto.

Neste tipo de coisas foram gastos centenas de milhões de euros financiando iniciativas que, pelo facto de não terem nada de estrutural, se configuram em mero desperdício e má utilização de fundos comunitários. Um exemplo desse tipo de empresa, a fazer fé nas informações dos jornais, era a Tecnoforma, uma empresa em que prestou serviço ao então deputado e atual primeiro-ministro Pedro Passos Coelho. Os projetos deste tipo de empresas eram tão importantes como dar formação em gestão e operação dos aeródromos do Centro de Portugal a 1063 formandos, quando os cerca de 3 aeródromos em operação empregavam menos de 10 pessoas. Mas havia também milhares de cursos de formação em todo o tipo de inutilidades, em infraestruturas desnecessárias e sem a necessária ponderação regional e nacional, na dispersão de responsabilidades por vários organismos que se criavam somente para “gerir” esses recursos financeiros que eram essenciais à transformação de que Portugal precisava. E ainda precisa.

Todo este cenário de desperdício de fundos comunitários foi reconhecido recentemente pelo atual Presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso, bem como por responsáveis governamentais nacionais.
Mas quero ser muito claro. Detesto a política baseada na suspeição permanente, na denúncia torpe como forma de bloquear reformas, ou no ataque pessoal gratuito como forma de diminuir a autoridade e legitimidade dos decisores políticos. Essa forma de atuar é ilegítima, antidemocrática e uma forte fragilidade de todo o nosso sistema político. No entanto, e apesar de considerar que nenhum decisor político é imune à falha – são seres humanos! –, tendo o direito de corrigir eventuais falhas sem perda de honorabilidade, considero que no momento grave em que vivemos, depois de um demolidor período de assistência financeira em que os portugueses foram chamados a sacrifícios muito dolorosos, é essencial que Pedro Passos Coelho esclareça dois pontos essenciais. A saber:

1. Teve vencimentos na empresa Tecnoforma? Se sim, foram esses rendimentos declarados ao fisco?
2. Qual foi a sua participação nessa empresa, nomeadamente na facilitação de acesso a financiamento europeu?

Estes dois pontos são, para mim, essenciais, pelo que desafio o primeiro-ministro a esclarecê-los cabalmente, sem margem para dúvidas e sem subterfúgios, no Parlamento que é a casa da Democracia e onde se materializa a sua legitimidade para governar.

A justificação é simples: no momento muito sério que vivemos o exemplo dado pelo primeiro-ministro é essencial para mobilizar a nação, procurando com isso constituir a liderança que permita que todos percebam e participem na imperiosa necessidade de reformar a forma como vivemos. Se o primeiro-ministro falhou nesse exemplo estamos perante uma gravíssima falha que tem consequências na legitimidade política para liderar o referido processo de reformas.

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