Opinião – O político efémero

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Bruno PaixãoBruno Paixão

Há umas semanas, o “Expresso” noticiava que Passos Coelho terá alertado os seus candidatos autárquicos para um estudo encomendado por si que concluía poder existir um efeito negativo causado pelo governo às candidaturas municipais do PSD. Este estudo terá apurado um decréscimo de 7% nas intenções de voto. A notícia, que passou ao lado dos comentadores políticos, deixa entreaberta uma questão: os eleitores aproveitarão as eleições autárquicas para, com o seu voto, sancionar as políticas de austeridade dos partidos que compõem o governo?

Tenho ouvido que sim e tenho ouvido que não. Mas a história recente mostra-nos que isso já aconteceu antes, quando o povo infligiu uma pesada derrota aos candidatos autárquicos do PS para penalizar o governo socialista, provocando a derrocada de António Guterres, em finais de 2001. Há, de facto, uma relação direta entre os partidos dominantes que se situam na orla do poder central e os seus candidatos às eleições locais, o que deixa aos socialistas a fundada expetativa de que a história se repetirá, mas agora a seu favor.

Todavia, as várias coligações autárquicas do PSD/CDS tendem a desvalorizar este facto. Argumento que cai por terra quando vemos que a maioria dos candidatos, até à data, tem mostrado vergonha em ostentar nos outdoors os símbolos destes partidos. É verdade! Se repararmos bem, a grande maioria dos candidatos fez desaparecer os símbolos do PSD e do CDS, adotando ícones algo estéreis que nada trazem de identificativo do ponto de vista ideológico. Símbolos que tanto poderiam estar num cartaz político como numa lata de conservas, num pacote de farinha ou numa carrinha de peixe congelado. Tenho ouvido chamar-lhes os falsos independentes. São membros de um partido mas tentam ocultá-lo. Junto do eleitorado dizem mal do partido; junto do partido, queixam-se da incompreensão do eleitorado.

Esta questão, virada do avesso, abre caminho a um tema de que gosto particularmente. Votamos nas ideias ou nas pessoas? Os estudos das últimas décadas têm posto a nu que a política ideológica tem perdido terreno, em detrimento da política centrada no indivíduo. Este desmoronamento de causas, que dá fôlego a uma estrutura de dominação, assenta no carisma do candidato e na exposição que este faz dos seus traços pessoais, no seu estrelato social, nas festas que frequenta, na forma como sorri para a câmara fotográfica, na roupa que usa, nas promessas que semeia, nas suas trivialidades pueris. Vivemos indubitavelmente num tempo de desvalorização do caráter e da honra. Vivemos hoje em anorexia ideológica e moral, numa atmosfera de entretenimento que conduz a que fiquem ocultadas na perceção pública as diferenças mais substantivas entre os candidatos. No momento da escolha, o essencial e o frívolo podem somar a mesma importância. Desta forma, sem ideologia, toda a política se torna efémera.

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