Mário Nunes
Na tarde do passado domingo, com o céu manchado de nuvens e o vento frio a enfraquecer o calor e a fazer encrespar a pele do corpo, serpenteámos a estrada de terra batida que liga a aldeia de São Sebastião ao Monte de Vez. O automóvel foi levantando o pó que polvilhou as plantas e deixou as suas folhas “macilentas” pela finíssima película que nelas se depositou. Atingimos o cume da montanha, um lugar paradisíaco, que não é o Monte Tabor, em Israel, onde já estivemos, mas um “plágio” com que a natureza bafejou aquele rincão do concelho de Penela, a milhares de quilómetros da montanha sagrada. Mas, ali, no Monte de Vez, o sagrado também se encontra, pois a capela em louvor da Senhora do Monte, a dominar a vastidão do horizonte que se dimensiona a perder de vista, consagra, espiritualmente, o local e tece um agradecimento ao criador graças à exuberante, encantadora e reconfortante paisagem que vincula o ambiente. Um espaço de beleza indescritível que contraria a densidade triturante do quotidiano das pessoas que vivem na azáfama fervilhante das cidades e locais de intensa poluição.
Ali, no Monte de Vez, aconteceu algo de inédito nestas paragens concelhias penelenses. Sob o azul celestial entrecortado pelas mencionadas nuvens, ali onde se liga o céu à terra, deu-se a apresentação da obra poética, “Na Força do Vento”, primeira, do sebastianense, Dr. David Duarte. A capa e o título, em sintonia com o vento que se fazia sentir, embelezaram-se com o moinho de vento ornamentado das velas brancas que o fazem rodar e se articulam com o equipamento, de molde a transformar os cereais em farinha. Moinho, ali ao lado das eólicas, gigantes, onde giram as enormes hélices que produzem energia, armazenada e distribuída, depois, pelo país. Tudo sob a bênção da Senhora, a festejar as bodas de prata da sua “aparição” no cume do monte. Centenas de pessoas comungaram do acontecimento cultural. Desde os representantes do Município e da Misericórdia, às escolas (não faltou a professora primária do autor) e ao grupo folclórico da Universidade, dos habitantes aos visitantes, todos se irmanaram na força que os trouxe ao local para partilharem daquele momento. E, na hora acertada, o livro foi exposto e apresentado. Um trabalho poético que é um hino ao Monte de Vez, à natureza, a São Sebastião e às suas gentes, de louvor à Virgem. Uma obra com 148 páginas, que registam 366 quadras e 48 poemas/prosa, um manancial de riqueza poética amadurecida na criatividade e sustentada no condensar das ideias e na espontaneidade do momento. Uma obra produto de uma força interior que vogou nas fímbrias mais íntimas do autor. Um projeto pleno de valores que responde na sombra das palavras, no impulso lírico, na memória do tempo, das pessoas, dos fatos e dos lugares. Uma poesia que deve ler-se com os olhos e a alma para dela retirarmos a mensagem e ou a emoção que encerra. Porque no seu conteúdo germina o sonho e é materializado o resultado de uma vida vivida na experiência e alicerçada no saber e na sensibilidade do poeta. Um trajeto de bairrismo, um guia de aprendizagem, um livro de agradecimento, o sentimento de humildade e humanismo, uma expressão de beleza, a paixão incontida e a força que vence a montanha. Um sonho de criança realizado em adulto. Parabéns ao David Duarte.