Opinião – Sobre os tempos de hoje, uma nota escrita antes de ontem

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JULIO MARQUES MOTAJúlio Marques Mota

Um outro aluno meu tem-me dito que sou mais “bruxo” que o bruxo de Fafe e um outro diz-me que é melhor eu não escrever nada porque faço as coisas acontecer! Logicamente, ironias sobre os tempos de desespero que nos atravessam é disto que falamos e que em muitos gelam os seus sentimentos quando os não destroem. Sobre os tempos de hoje, exactamente hoje, uma nota escrita ontem.

Numa nota sobre o artigo “Impostos sobre os ricos! Na verdade, devemos passá-los para o dobro”, escrito por Richard Eskow, publicado pelo blog em Novembro de 2011, escrevi o texto que se segue dedicado a um antigo aluno meu que agora toma posse como Secretário de Estado, um texto que vale a pena hoje ser lembrado.

 

Um antigo aluno meu, Fernando Alexandre, actualmente professor na Universidade do Minho e coordenador do estudo “A Poupança em Portugal”, deu recentemente uma entrevista ao jornalPúblico. Fiquei estarrecido com o texto pensado e produzido no momento em que Portugal atravessa a sua mais profunda crise económica, social e política das últimas décadas, com o fascismo encapotado ao assalto do poder e, mais ainda, com este meu antigo aluno a justificar tudo isto.

Inegavelmente o tempo tudo come, tudo leva, sobretudo quando as coisas emocionalmente parecem estar coladas a cuspo, coladas ao sabor do vento. Desse aluno a quem terei dado 15, 16 valores, para o máximo até hoje dado de 18 de valores, fica-me, por exemplo, a lembrança de uma sessão de cinema, em 1993, sobre as Vinhas da Ira, uma homenagem às vítimas da Crise, uma homenagem a homens da estirpe de Roosevelt, homens de que hoje já não vemos outros exemplares.

Desse mesmo aluno ainda me lembro de lhe ter criado as circunstâncias para beneficiar de uma bolsa de estudo que lhe permitiu “estagiar” junto de Jean-Paul Fitoussi, naquela que é para mim uma das mais emblemáticas instituições francesas ligadas à reflexão em Economia, o OFCE, Observatoire Français des Conjonctures Économiques — Centre de recherche en économie, de Sciences Po.

Desse mesmo aluno fica-me agora, e agora que vou embora reformado e bem cansado da ignorância que nas Universidades está a ser conscientemente criada, fica-me a tristeza de ler esta entrevista que me parece um insulto a todas as vítimas da crise já bem identificadas e a todas as outras vítimas que esta mesma política há-de criar, para além de ser um insulto também ao ensino sério que todos aqueles que seriamente o ensinaram lhe possibilitaram. E eu fui um deles.

Já que ele gostava tanto de cinema, lembro-me aqui de Visconti, do filme Os Malditos, lembro-me de uma personagem central, Aschenbach creio, que à sua prima lhe diz mais ou menos isto apontando os ficheiros de informações da Gestapo: “a contribuição do povo alemão ao IIIº Reich”. Cito de memória, mas sinceramente sinto que com quadros mentais como aquele que a entrevista estabelece e com as políticas que este mesmo quadro induz estamos perante uma forma equivalente à citação aqui colocada. Uma contribuição para que Passos Coelho esmague todos aqueles que trabalham e o país a que pertencem e que na escala dos rendimentos ficam situados do meio da escala de rendimentos para baixo.

Haja alguém por quem este texto abaixo publicado assim como o documento que nele está citado lhe possa ser enviado. Por mim, não!

 

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