Paulo Almeida
Portugal devia gostar mais das empresas e das pessoas que as criam e que assumem o risco de navegar em mares de incertezas, custos elevados e burocracia desnecessária. As políticas empresariais castram o empreendedorismo e, por isso mesmo, uma empresa é algo que muitas vezes só se deseja aos outros.
Apesar dos programas governamentais com palavras gordas e grandes planos serem bons veículos de fundos, não passam de mecanismos que actuam com o que lhes é dado, e que é pouco. Para quem já pensou a sério criar uma empresa, a probabilidade em desistir antes de começar é enorme. Hoje em dia, para infelicidade das nossas perspectivas de crescimento, restam muito poucos corações que aguentem a tarefa de erguer um negócio.
Esta aversão não é de agora e a especificidade portuguesa consiste na sua dimensão, inversamente proporcional ao tamanho do problema. Um dos maiores obstáculos é o elevado grau de certeza de ir ser maltratado no caso de a empresa falhar. A insolvência ainda é uma ferida que leva demasiado tempo a cicatrizar.
Apesar de serem extremamente reduzidos os casos de fraude, as pessoas ficam muito estigmatizadas por causa da insolvência, mesmo quando de facto (e de direito) são ilibadas de qualquer responsabilidade. A exoneração do passivo é uma ajuda que não chega para afastar um receio culturalmente enraizado. Especialmente quando a ideia de ficar anos a fio “na prateleira” até poder regressar ao activo é um convite a baixar os braços. Quanto mais tempo demorar a chegada do sistema do fresh start, mais ideias de negócio, iniciativas e empreendedores se irão perder. Por vezes, uma segunda hipótese bastaria.
Depois há o dinheiro. Reunir capital para materializar a ideia nunca é fácil. A escada da dificuldade aumenta quanto mais dinheiro for preciso. Muito poucos têm familiares e amigos a quem recorrer e os investidores institucionais quase nem existem. A aposta na língua portuguesa é aqui fundamental. A comunidade de países que falam português é uma grelha de apoio bem maior do que o nosso país considerado isoladamente.
É sempre mais fácil arranjar investimento quando se fala a mesma língua e há pontos de contacto culturais fortes (não é por acaso que se ouvem notícias de grupos empresariais angolanos a investir em Portugal). A Europa está a definhar e, se recuperar, vai demorar muito tempo. Aguenta-se com grandes empresas criadas no virar do século passado. Depois das grandes guerras, são muito poucas as grandes empresas nascidas no velho continente, com destaque para Inditex (Zara), Virgin, Red Bull e Ikea.
Um recente estudo da Ernst & Young revelou que a “próxima” Microsoft ou Google tem mais condições de nascer em São Francisco, Xangai ou Bombaim do que em qualquer outra cidade no mundo. E uns incríveis 60% de brasileiros consideram o seu país o melhor para dar início à sua empresa. Aqui está um bom ponto de contacto onde o Estado português deveria investir.
Repito: os nossos problemas são comuns aos do resto da Europa, um continente a perder importância e influência a uma velocidade vertiginosa. Um Portugal na cauda da Europa, sem petróleo, gás natural ou outros recursos naturais tem de descer brutalmente os impostos, muito mais do que qualquer outro país europeu, e de amputar as despesas do Estado, muito mais do que os almejados 4 mil milhões. Eu não quero um balão de oxigénio para o meu país. Preferia uns pulmões novos.