Elsa Ligeiro
Começo aceitar a tese que os portugueses são piegas e queixinhas. Confesso que no início também eu achei a classificação injusta. Se o nosso primeiro-ministro tivesse o cuidado de ter dito logo “alguns” portugueses (o que me excluía), e não: os portugueses (do continente e ilhas), não voltava a pensar no assunto.
Mas tenho de dar a mão à palmatória. Ele está cheio de razão. E para prová-lo tenho comigo um anúncio de emprego que uma empresa (nitidamente aflita) colocou na minha caixa de correio com o título: Oportunidade Única.
A empresa que se diz multinacional, tem 40 escritórios em Portugal e mais de 20 anos de actividades em diversos departamentos, oferece entrada imediata; excelente ambiente de trabalho; oportunidade de carreira; bonificação pelo empenho (repararam no pormenor do desempenho ser secundário?, têm toda a razão em valorizar o empenho); e evolução na carreira.
E o que eles nos pedem? Nada de mais:
Boa apresentação (que um bom estilista resolve, e uma boa dieta, das que anunciam na televisão, em que basta dormir um bom sono e os quilos desaparecem); espírito de equipa (alguém duvida que qualquer português tem o maior empenho em ver a sua equipa de futebol jogar bem?); gosto e apetência por comunicação (basta ver os telejornais e confirmar o gosto e a apetência que muitos portugueses têm para comunicar as suas misérias particulares); motivação, dinamismo e ambição (quem a não terá com as ofertas de uma empresa multinacional, com 40 escritórios em Portugal?); responsabilidade e capacidade de liderança (isto era escusado. Se estão há tantos anos em Portugal já devem saber que há em cada português um chefe, um candidato a líder).
Mesmo no final do anúncio acrescentam que necessitam de portugueses dos 18 aos 65 anos para lhes oferecer o que já referi no início.
O que prova que a ideia fixa de os trabalhadores com mais de 40 anos não conseguirem um novo emprego é uma pieguice.
E a inevitável conclusão de que em Portugal só não trabalha quem não quer.
Ou quem não tem caixa de correio.
PS – Depois do meu empenho na divulgação da Oportunidade Única que me ofereceu a minha caixa de correio, li a última frase do anúncio que, como num bom romance, abre caminho a uma nova interpretação: “Trabalhamos para formar futuros empresários”.