Mário Nunes
O bolo com fava é uma das características do dia de Reis. Desde há anos que a fava da tradição tem calhado à maioria dos portugueses e o bolo sem fava chega, somente, a um número restrito de privilegiados, a mesas de luxo, onde a poupança é uma palavra desconhecida e o esbanjar não tem regras, enquanto os desfavorecidos enganam o estômago com as migalhas, muitas das vezes dadas por outros que se assemelham a si nesta desdita. Portanto, os portugueses, como diz o ditado popular, têm sido mandados à fava. Neste entendimento, verificamos que os trabalhadores e que vivem do salário do seu trabalho, desde os funcionários públicos até aos professores, agricultores, jornalistas, operários e mais um rol de profissões têm sido mimoseados com as favas da austeridade, logo reduzindo a sua capacidade económica e financeira que os inibe de saborear, em dia de Reis, o bolo sem a fava dura de roer, mas que, “por ser tradição desde há anos”, tem de ser mastigado e engolido.
Este ano, a fava é, ainda, mais dura. Foi distribuída pela saúde, educação, transportes, eletricidade, gás, alimentação, comunicações, bebidas, automóveis e outro conjunto de bens e serviços, sem esquecer os impostos diretos e indiretos. São bolos-reis com favas tão grandes que quase eliminam a doçura e anulam o paladar que a boca espera. Mas, são apenas para alguns, A distribuição equitativa está, ainda, em fase de inquérito e precisa de receber o devido parecer.
Mas, se analisarmos o valor da fava com intuitos de saúde, podemos constatar que a fava tem excelentes calorias, sendo um alimento de qualidade, enquanto o bolo, onde se coloca a fava, é prejudicial, pois em excesso provoca a obesidade e esta é sintoma de engorda negativa.
Hoje é dia de Reis, última manifestação religiosa do período natalício. Segundo a história e recuando à Idade Média, a festa dos Reis Magos revestia-se de pompa e circunstância. Nas igrejas e nos adros celebravam-se os mistérios, representações litúrgicas que evocavam a solene caminhada dos três Reis Magos vindos do Oriente, carregando presentes para um Rei que uma estrela nova surgida no céu acabara de anunciar. E, estes Reis, de santos, começaram a ser venerados nas residências com rituais que o tempo consagrou. Um deles era a partilha de um bolo de que se guardava uma fatia para oferecer ao mendigo ou caminhante que nessa altura batesse à porta. Introduziu-se, também, o costume de no bolo se colocar uma fava, fruto que dava a honra para quem a recebesse na sua fatia, de ser o rei ou rainha da festa. Porém, a honra trazia a obrigação daquele oferecer as bebidas, dever que os avarentos procuraram suprimir, engolindo-a. Para eliminar esta “fuga”, introduziram-se no bolo favas de porcelana, de esmalte e mais tarde de plástico. Todavia, a evolução da tradição deixou cair a obrigação das bebidas e a eleição do rei ou rainha, enquanto o mendigo e o visitante deixaram de bater à porta para receber a fatia do bolo. Ficaram os elementos integradores da festa e o bolo com a fava, nascendo o costume: “quem encontrar a fava tem de pagar o bolo no ano seguinte”, enquanto os grupos folclóricos recuperaram a visita do mendigo cantando às portas e comendo os bolos que os proprietários lhes oferecem.
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