Orlando Ribeiro homenageado

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Manuel Augusto Rodrigues

Na passagem do centenário do nascimento de Orlando Ribeiro, a Academia das Ciências dedicou a sua sessão ordinária ao grande geógrafo cuja actividade e obra marcaram uma época.

Apresentou uma comunicação a Prof.ª. Doutora Teresa Barata Salgueiro, intitulada “Orlando Ribeiro e os estudos urbanos de Geografia” em que dissertou com grande brilho sobre a importância dum assunto que mereceu ao ilustre homenageado um interesse especial de que é exemplo esclarecedor o artigo que elaborou para “Dicionário de História de Portugal”, considerado como sendo do melhor que jamais se escreveu entre nós.

Jorge Gaspar chamou-lhe o Primeiro Mestre de Geografia Portuguesa, um dos grandes mestres da Geografia do século XX, um dos sábios de que Portugal se pode orgulhar. Formou várias gerações de geógrafos portugueses e influenciou muitos outros cientistas e intelectuais dos mais diversos domínios do saber, sempre dentro de uma visão interdisciplinar.

Frequentou as Faculdades de Ciências e de Letras da Universidade de Lisboa e o Instituto Superior Técnico tendo-se doutorado em 1936. Fiel à sua vocação de geógrafo cimentou a sua formação em Paris e em centros científicos de outros países e contactou com grandes personalidades do seu tempo. Lembramos David Lopes e Leite de Vasconcelos, e depois em Coimbra, onde criou o Centro de Estudos Geográficos em 1942, Paulo Merêa, Paiva Boléo e Paulo Quintela, entre outros, aos quais podemos juntar nomes grados estrangeiros, nomeadamente franceses, espanhóis e o alemão H. Lautensach, que dedicou vários estudos de elevado mérito a Portugal, tendo vindo a ser doutorado “honoris causa” pela Universidade de Coimbra em 1937, distinção também atribuída a Orlando Ribeiro em 1984. Aliás outras Universidades consagraram de igual modo o saber do insigne cientista.

Em Coimbra esboça e publica em 1945 a importante obra “Portugal, o Mediterrâneo e o Atlântico”. Em Lisboa criou em 1943 o Centro de Estudos Geográficos, revelando um invulgar interesse pela geografia física, cultural e histórica, incluindo o Ultramar português, consciente de que havia que promover o encontro de culturas. A sua vasta produção científica foi recolhida em “Opúsculos Geográficos”, 6 volumes, publicados pela Fundação Calouste Gulbenkian, graças à dedicada colaboração de Suzanne Daveau, sua esposa.

As palavras que escreveu em “Ciências e Humanismo” sintetizam o rumo que traçou para a vida: «…naturalista e humanista, sempre usei daquela verdade que manda Deus que se diga, agrade ou não aos homens acomodatícios e à inépcia dos que governam. Não há liberdade sem coragem, mas esta começa ao defender das contingências de momentos conturbados aquilo que a um espírito recto e justo se afigurou tocar de muito perto a exactidão das coisas e do pensamento».

Em “Cinquenta Anos de vida Científica e Universitária” confessa: “Na minha profunda devoção à Ciência procurei, por um travejamento firme, algumas ideias novas e alguns caminhos de pesquisas que ainda parece valer a pena seguir (…). Se toda a Ciência houvesse de ruir seria decepcionante cultivá-la. Nela há claridades que iluminarão para sempre. Esta profunda convicção sustentou durante 50 anos o trabalho a que devotei a vida, em que comprometi irremediavelmente a saúde, mas animando sempre o meu modesto mas entusiástico esforço criador. Sem ele não há mais do que acúmulos de factos, sem aquela centelha de génio que, como na música ou na poesia cria, renova e traz ao espírito a luz do próprio reconforto”.

A vida de Orlando Ribeiro foi uma longa caminhada ao serviço da Universidade e da ciência, como escreveu Veiga Simão numa conferência integrada num ciclo em torno da sua obra, que teve lugar na Biblioteca Orlando Ribeiro, em 2006. Contactou de perto com Orlando Ribeiro, e, no texto já referido, concentra a sua atenção nas preocupações de renovação da Universidade que orientaram o espírito do célebre geógrafo de gabinete e do campo. Caracteriza-o como criador científico e humanista, peregrino da ciência universal e conselheiro de aventuras contra o arcaísmo e o imobilismo. Nos anos 70, quando Veiga Simão metia ombros à Reforma Educativa, lá estava Orlando Ribeiro para quem, como para Pascal, toda a dignidade do homem está no pensamento. Orlando Ribeiro tomava muito a peito a remodelação do ensino universitário, defendendo a criação de mais Universidades que viessem rejuvenescer as existentes, mas sempre num clima de exigência e rigor. E assim surgiram as do Minho, Aveiro, Nova de Lisboa e Évora. O seu estudo “O Problema Fundamental da Universidade” de 1975 é um alerta que ainda hoje se lê com imenso proveito.

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