Francisco Queirós
Estava este pequeno país descansadinho, muito aliviado com a caridade do FMI e do Banco Central Europeu, a solidariedade da Senhora Merkel, a alegria reencontrada do engenheiro Sócrates, de Passos Coelho e de Portas e eis que rebenta o escândalo. O patrão do FMI tentou violar uma empregada do hotel. O ex-ministro francês, dirigente socialista, homem rico, o todo-poderoso director-geral do FMI, putativo candidato a presidente da França é apanhado em fuga depois de tentar violar, num hotel de luxo de Nova Iorque, uma criada originária do terceiro-mundo. E comentadores não faltam. Que Dominique Strauss-Kahn foi vítima de conspiração. Que se excedeu um pouco, afinal também Berlusconi é um verdadeiro macho, e a um e a outro senhor são reconhecidos direitos medievais de pernada. Diga-se o que se disser, a serem reais os factos, esta história é inqualificável. Mas a história de DSK no hotel de Nova Iorque não deixa de ser uma imagem representativa do nosso tempo, uma metáfora do momento que vivemos. DSK comporta-se perante uma pobre criada de hotel, imigrante africana, como o senhor poderoso que abusa a bel-prazer dos seus servos. E não tem sido esse, o papel do FMI desde que foi fundado no final da segunda guerra mundial?
O abuso, a violentação dos mais fracos pelos mais fortes faz parte essencial da história dos povos. Mas também o protesto, a resistência e a revolta. A vida ensina, tal como a vida colectiva dos povos, que apenas pela luta se pode vencer. Lutando por vezes ganha-se, por vezes perde-se. Mas sem luta perde-se sempre.
Que dirá a mulher de 30 anos, grávida de 8 meses, violada pelo médico numa consulta de psiquiatria, em 2009, no Porto? Segundo os jornais, a paciente, sofrendo de depressão, terá sido durante a consulta convidada a deitar-se na marquesa, depois foi apalpada pelo psiquiatra de 48 anos, obrigada através de empurrões e de puxões de cabelo a praticar sexo oral com o seu psiquiatra que a terá ainda virado de costas e empurrando-a, lhe baixou as calças, e a terá penetrado até ejacular. O psiquiatra foi condenado em primeira instância por prática do crime de violação. O tribunal da relação anulou a sentença, com o voto vencido de um dos juízes. Segundo a imprensa, o tribunal considerou no seu acórdão que “a recusa meramente verbal ou ausência de vontade, de adesão ou de consentimento da ofendida são, por si só, insuficientes para se julgar verificado o crime de violação”. Mesmo tratando-se de uma mulher no final da gravidez que recorre a uma consulta psiquiátrica por estar doente e fragilizada e que instintivamente defende o feto, evitando agressões mais violentas. Será? A senhora teria de ter combatido ferozmente para ter o direito a não ter relações sexuais que não desejava!
Moral desta crónica? Uma ajuda – poder, sexo, abuso, luta, justiça…
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