No país das trindades

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Francisco Queirós

“Era uma vez… um pequeno país que graças a desastrados anos de maus reinados e à cobiça de poderosos senhores estrangeiros caiu na desgraça“.

Então foi violentamente invadido por uma troika de cavaleiros do apocalipse que não dizimaram toda a população do reino, mas, maleficamente, impuseram uma panóplia interminável de sofrimentos ao pobre povo.

No pequeno reino, alguns nobres, os mesmos que há muitos e muitos anos governavam, dispuseram-se não a recuperar a independência e a soberania da Nação, produzindo riqueza e distribuindo-a justamente pela população, mas a prestar vassalagem aos três invasores. E era vê-los a correr como loucos em busca do troféu.

Declaravam uns que fora por mérito seu que houve acordo com a troika estrangeira. Outros afirmavam, orgulhosos, que sem eles, o acordo não seria positivo. Outros ainda garantiam que a sua marca era evidente em todo o acordo, o que só não via quem não queria ver.

E quase se desunhavam e se matavam uns aos outros para conquistarem o troféu que consistia no reconhecimento público da paternidade do acordo com os legados estrangeiros. Naquele tempo, há muitos, muitos anos chamavam-lhes nobres do arco do poder.

Nobres ufanos pelos elevados serviços prestados à Pátria. Não pelos serviços abnegadamente exercidos ao longo das décadas de estadas no governo, tempo em que as suas folhas de serviço se pejaram de louvores e os peitos de medalhas, graças à destruição do tecido produtivo do reino, das pescas, da agricultura, da indústria transformadora que agora descaradamente diziam ser necessário fortalecer. Nobres inocentes! Era vê-los triunfantes e orgulhosos do seu papel de colaboracionistas da troika.

No entanto, discutiam acaloradamente entre si, dando imagem de uma trindade desavinda. E que discutiam, tão nobres criaturas? Novos e diferentes rumos para o reino? Alternativas? Não. Os três guerreiros do dito arco do poder polemizavam sobre as armas a usar. Bestas, lanças ou espadas? Não estava em apreço evitar que corresse sangue.

As diferenças, se as havia, residiam nos métodos. E a tríade de nobres cavaleiros, vassalos de outra trindade a quem naqueles tempos chamavam troika, dirimia interminavelmente a suprema questão dos métodos de tortura. Com chicote ou com tratos de polé, no berço de judas ou no burro espanhol? E o povo desesperava perante tão triste quanto miserável espectáculo.

Naqueles tempos, há muito, muito tempo, também havia quem cresse que era possível reconquistar a dignidade da Nação, a sua soberania nacional, produzindo riqueza, cultivando os campos, armando barcos de pesca e desenvolvendo as indústrias e dividindo mais justamente a riqueza produzida. Esses foram os que triunfaram.”

– Pai, essa história é muito triste, mas acaba bem! Eu acho que se as pessoas quiserem as histórias podem ter um final feliz! Que país era esse? – perguntou a menina quase, quase a adormecer.

 

 

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