Perlenga da terra

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Ano do voluntariado. Agravamento da crise económica, financeira e social. Redução dos apoios à Cultura, a eterna sacrificada. Encurtamento dos orçamentos municipais. Discursos inflamados preconizando poupança e sacrifício para a maioria (os sempre presentes) e olvidando os bem remunerados. Austeridade. Conciliação partidária sugerida e partidos desavindos. Interesses nacionais acima e em substituição das perlengas verbais. Especialistas em economia ora em acordo ora em desacordo. Manifestações críticas contra a queda dolorosa para o abismo e a exigir emprego. Recurso à memória histórica a recordar os tempos difíceis que Portugal ultrapassou pela união de esforços e sacrifícios. Enfim, num altruísta brado de fervor clama-se a esperança num futuro melhor e despido de preocupações e tormentos que avassalam a Nação. União, coragem, determinação e criatividade são valores e trunfos para a mudança desejada. A alma lusitana que se quer erguida para alcançarmos a vitória.

E, foi com este último estado de espírito e com a certeza que sem vontades colectivas o amanhã não existe, que um grupo de cidadãos do Espinhal, apoiados pela população e junta, meteu ombros à restauração do imóvel da Casa da Cultura. Edifício degradado, que foi Casa do Povo e centro cultural. Obras eram precisas. Promessas oficiais mas adiadas – ficou, apenas o nome na sinalética, Casa da Cultura (bem escolhido) – protelaram o sonho. Contudo, o Espinhal, uma terra de intensa actividade cultural ao longo dos séculos, jamais deixou morrer esse desígnio passado de geração em geração. E, em tempo de crise e no ano do voluntariado, os residentes e ausentes, apoiados pela Junta, não hesitaram. Dias e noites de trabalho, oferta de material e palco e plateia recuperados, e a cara lavada às paredes.

Obra feita exigia abertura ao público. Dois elementos que pertenceram à Escola da Noite, António Jorge e Sílvia, que adquiriram residência de campo na Vila do Espinhal, fomentaram os contactos com o Município de Penela, a Junta de Freguesia e a Filarmónica orientada pelo maestro José Antero. O entusiasmo pelo teatro regressou. Nasceu o Grupo de Teatro do Espinhal. Actores locais, alguns experimentados e sensibilizados às palmas, disponibilizaram-se. E, os ensaios à noite e fins de semana prepararam a peça, intitulada “Perlenga da terra”, estruturada no momento actual e nas lendas concelhias de bravura, da guerra, do amor e da conquista entre cristãos e mouros. E o Grupo e a Filarmónica em comunhão de valores dramaturgos levaram a peça ao palco. Mais de três centenas e meia de cidadãos encheram a Casa da Cultura. O êxito clamoroso provou que as pessoas e as instituições, quando se empenham com a alma lusitana e bairrista, mesmo sem orçamento, conseguem milagres. E, este acto grandioso pode servir de estímulo aos que muito perlengam e esquecem o trabalho. Parabéns aos espinhalenses.

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