João Boavida
É a ideia que dá: uma nau de loucos, com o leme partido e as velas rotas. O Presidente faz um discurso incendiário, quando a atmosfera estava ao rubro e o calor era sufocante. Um bombeiro pirómano em dia de greve. O Governo, (por falta de jeito ou premeditadamente?) como se não tivesse que dar contas a ninguém, nem soubesse da fragilidade política em que estava, pareceu um elefante desorientado por uma loja de louças.
Quanto às oposições, sempre o mesmo; não têm emenda. Uns, à direita, com uma ânsia de poder que chega a ser impudica; outros, à esquerda, sempre cantando de fora, perderam a razão e a realidade.
Quanto à direita, lembramo-nos bem da sua ave canora, à frente d’ O Independente, anunciando escândalos todas as semanas. Muitos sem consistência, simples fogos de palha, mas impiedosos e sistemáticos até à destruição do Governo de Cavaco Silva. A quem agora tecem loas.
Os da esquerda esquecem-se que sempre foram contra todos os acordos, todos os orçamentos, todas as concertações sociais, todas as coligações, todos os entendimentos, enfim tudo o que fosse resolução de problemas. Nem à esquerda nem à direita há autoridade moral. E que falta ela faz!
Mas continuam. À direita, a invocar princípios e coerências, e à esquerda a apregoar coerências e princípios. Uns, mudam de princípios como de camisa, embora digam, em relação a tudo, que “sempre têm dito”, etc. Outros, com duas ou três ideias mais secas e espalmadas que arenque fumado; sempre de facto disseram (dizem e dirão) o mesmo.
Mas a massa não política não está melhor. Uns, em jornais, blogs, entrevistas de rua para as televisões e antenas abertas, com comentários tolos ou furiosos, mostram como nos falta bom senso, informação e espírito democrático. Outros, muitos, cada vez mais, achando que “todos” são iguais, ajudam a afastar os competentes e alimentam a praga dos carreiristas, que dão cabo do país.
E quanto à crise atual, também temos muitas culpas. Andámos, durante anos, endividando-nos euforicamente, como se fôssemos ricos. Continuávamos pobres e pouco produtivos, mas levados pela indústria do consumo, chegamos a isto. E os bancos a empurrarem-nos para crédito em massa e o consumo desenfreado. E não explicando que, para nos emprestar, endividavam-se nos bancos estrangeiros. Ninguém alertava: nem Governo, nem Presidente, nem Oposição, nem comunicação social; só um ou outro medina-carreira ou ferreira-leite, que ninguém quis ouvir. E agora reclamamos e fazemos greves. Para melhorar a situação e facilitar a vida aos mais pobres, claro. A irracionalidade, a estupidez e a velhacaria deviam pagar imposto.