Médica assassinada em casa (actualizada)

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Foto Gonçalo Manuel Martins

Empregada doméstica entrou em casa pela manhã e encontrou cadáver com faca espetada no pescoço. Testemunhas garantem haver uma corda pendurada na varanda. PJ está a investigar homicídio.

O corpo, seminu e ensanguentado, está no chão do quarto. São pouco mais de oito e meia da manhã. A empregada doméstica, uma dúzia de anos de casa, abre a porta como faz todas as terças e quintas-feiras. O quadro com que se depara é terrível.
Eugénia Rosa Fernandes Madeira, 55 anos, é médica no Centro de Saúde Norton de Matos. Há 17 anos, com passagem pela Extensão de Ceira. Segunda-feira, fez consultas não programadas até às oito da noite. Como habitualmente, o seu feitio descontraído e bem-humorado contagiou quem esteve, como confirmam as enfermeiras Paula e Sandra. E também a colega Ana Rita,uma jovem médica que vai casar-se no sábado e que, por isso, Eugénia tratou de mandar para casa.
Eugénia Madeira vive num rés-do-chão de um bloco de apartamentos selectos, na encosta da Quinta da Lomba. O filho, adoptivo, está ainda de férias na Figueira da Foz. Vai no 4.º ano de Medicina e dizem que é muito bom aluno. Aos mais próximos, a mãe – recém-saída de um longo, penoso… e dispendioso processo de divórcio – diz só esperar que o jovem acabe o curso para recuperar a vida, na plenitude.
A rotina diária da médica fá-la passar todos os fins de dia por casa dos pais. O casal, já idoso, vive justamente ali ao lado do centro de saúde. De há dois meses para cá, a preocupação da filha redobrou, depois de a mãe ter sido operada.

No dia dos 81 anos do pai

É natural, por isso, que o pai de Eugénia Madeira tenha estranhado, ontem de manhã, a ausência do carro da filha, no lugar do costume, no parque de estacionamento do centro de saúde. Pouco depois, seria a directora da unidade, Conceição Milheiro, a dar-lhe a fatídica notícia. Ao pai, que assinalou justamente ontem o seu 81.º aniversário.
De volta à manhã agitada na Quinta da Lomba.  Mal refeita do susto, mas ainda aflita, a empregada de Eugénia Madeira recorre ao conhecido mais próximo: Rui Nogueira, vizinho na urbanização e, curiosamente, também médico no Centro de Saúde Norton de Matos. É este que desencadeia os procedimentos habituais, chamando a autoridade policial e o INEM. Que, diga-se, não demoram a chegar, já que a PSP tem o comando ali em baixo, na Elísio de Moura.
Durante toda a manhã, é um corrupio no Lote 12 da Quinta da Lomba. Primeiro, é a patrulha da PSP e a viatura de emergência médica. Depois, chegam colegas do centro de saúde, nomeadamente, a directora e a colega, Madalena Cabral – elas que vinham ainda com a convicção de que se trataria de um caso de morte súbita. Ainda antes das dez é a vez dos inspectores da polícia científica e dos procedimentos e aparato que já são habituais.

Uma corda
na varanda

Dentro de casa só entra quem está a trabalhar. Mas, cá fora, todos vêem uma corda para acesso à varanda. As informações são, naturalmente, múltiplas e contraditórias. Algumas claramente especulativas. Daí que seja prudente escrever que a polícia “não confirma nem desmente” que o cadáver estava nu da cintura para cima, no quarto, com a cabeça tapada por uma almofada e com uma faca no pescoço ou no peito.
“A polícia está a investigar, num quadro de homicídio”, limita-se a dizer uma fonte da direcção da PJ/Coimbra, cerca das seis da tarde.
Pouco antes, o DIÁRIO AS BEIRAS apura que, pelos primeiros indícios, estará descartada a ocorrência de ofensas sexuais. Cabe dizer que, durante toda a manhã, o cenário de violação percorreu o circuito das informações mais veiculadas.
Outro dos cenários montados, pela manhã, foi o de um assalto com desfecho fatal. Em sustento da tese está a corda, na varanda, e a unanimidade entre os próximos, no que respeita à total ausência de inimigos. Também aqui a polícia nada adianta, nomeadamente sobre a possibilidade de terem sido mais do que um intrusos.

Filha única
e mãe de filho único

Vindo da Figueira da Foz – onde estava em fim de férias e onde, de resto, a mãe se deslocava amiúde –, o filho de Eugénia Madeira chega rápido a casa. Com a empregada doméstica, são acompanhados por um psicólogo do INEM. Durante o dia, caber-lhe-á repartir a dor com o acompanhamento das formalidades legais necessárias. O que, entende-se, não é fácil.
Já noite dentro,  ficou finalmente a saber-se os detalhes das exéquias: o corpo da malograda médica fica, durante a noite, ainda nas instalações do Instituto Nacional de Medicina Legal – onde ontem foi autopsiado –, saindo apenas hoje para o Mosteiro de Celas. Aqui estará em câmara ardente, a partir das 11H00. O funeral está agendado para as 16H30, no cemitério de Chelo, Penacova, de onde é originária a família da vítima.
O estudante de Medicina, já se disse, é filho único, adoptado, de Eugénia Madeira, ela também filha única.

Amiga de todos

Conceição Milheiro, directora do Centro de Saúde Norton de Matos e amiga de Eugénia Madeira, não tem dúvidas: “A sua enorme abertura de espírito e o perfil brincalhão, com uma grande dose de humor, fazia com que toda a gente gostasse dela”. De resto, o texto publicado ao lado diz tudo.
Eugénia Madeira não se esquivava a qualquer actividade lúdica, no centro de saúde. Sardinhadas, convívios, excursões, descidas de rio. Em todas as ocasiões levava o sorriso e o jeito particular de tornar os ambientes mais leves e descontraídos.
O mês de Agosto foi de trabalho, no centro de saúde. Redobrado, como sucede em todos os serviços em todos os meses de Agosto. “Nunca se queixou”, diz Conceição Milheiro. Agora, com um período de férias marcado para ter início já amanhã, dia 8 de Setembro, preparava-se para descansar.

Revolta

No Centro de Saúde Norton de Matos, como se imagina, o ambiente era de enorme tristeza, ontem, como o DIÁRIO AS BEIRAS testemunhou, durante o dia. Um sentimento que, de resto, era transversal a todo o pessoal ali em serviço e, até, a alguns doentes que iam sabendo da tragédia.
Contactado pelo DIÁRIO AS BEIRAS, Rui Nogueira, médico e vizinho da vítima, escusou-se a revelar qualquer pormenor. Mas não escondeu a “revolta e profunda amargura” pela forma como o assunto estava a ser tratado, na comunicação social. “Não há qualquer respeito pela memória da vítima e pela sua família”, remata.

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