Mais de metade da área de Portugal continental está coberta por matos e florestas que, pelo efeito da fotossíntese absorvem anidrido carbónico, fixam carbono e libertam oxigénio, purificando o ar, e que pela evapotranspiração fazem retornar à atmosfera, sob a forma de vapor de água, até 90% da água que sugam dos solos, em ciclos vitais para a vida. As florestas são ecossistemas fascinantes que também permitem criar riqueza a quem delas extrai bens, como os materiais lenhosos, mas o risco de incêndio florestal, sempre presente, pode por tudo em causa.
Em torno das florestas giram muitos interesses, dos ambientais aos económicos e lúdicos, que se forem conjugados devidamente facilitam retirar o melhor partido de solos que, mesmo quando são pobres em nutrientes, permitem às florestas criar bem-estar e riqueza. As florestas têm um interesse global inigualável; todavia, qualquer exploração florestal gera resíduos florestais. Se esta biomassa florestal residual (BFR) for incorporada nos solos, aumentará a fertilidade destes, mas se for abandonada nas florestas, fará aumentar o risco de incêndio florestal, sobretudo em países meridionais. Acresce que este risco é cada vez maior, fruto de um aquecimento global que resulta de alterações climáticas que afetam o nosso planeta, de modo cada vez mais nítido.
Em média, Portugal vem perdendo cem mil hectares de matos e floresta por ano. Mas 2017 foi calamitoso, tendo morrido 115 pessoas e incontáveis animais em numerosos incêndios florestais que destruíram mais de meio milhão de hectares de floresta e matos, cerca de duas mil habitações, mais de meio milhar de empresas, e que arruinaram muitos negócios. Os incêndios florestais resultam da conjugação de múltiplos fatores, avultando o êxodo de populações rurais que, na busca de melhores condições de vida, geram desertificação humana ao longo deste país. Como estas mudanças sociais são irreversíveis, as mesmas já deviam ter conduzido ao reforço do associativismo e cooperativismo, visando novas formas de gestão de povoamentos florestais.
Prevenir o risco de incêndio florestal obriga a retirar carga combustível da floresta, pelo que os governos têm imposto limpezas florestais, às quais a maioria do povo tem correspondido mais que o Estado, que tardando em limpar tudo o que lhe compete, faz antecipar que nunca cumprirá com o que exige ao nosso povo… E mesmo sabendo que os resíduos florestais têm uma muito baixa densidade, pelo que a sua recolha, transporte e eliminação colocam dificuldades técnicas e económicas, este Governo não legislou de modo a facilitar e a promover a recolha e valorização da BFR, onde a mesma demonstre possuir racionalidade ambiental, social e económica.
Se não existirem muitas mais centrais térmicas e termoelétricas, e outras infraestruturas que permitam valorizar milhões de toneladas de BFR que são gerados anualmente nas operações de gestão florestal ao longo do país, os mesmos continuarão a ser abandonados nas florestas, onde arderão descontroladamente, fora e dentro das zonas de proteção de habitações e de povoações.
Se a BFR gerada continuamente não vier a ser valorizada, o país continuará a arder ano após ano, o que trará mais pobreza em vez de criar maior riqueza, pelo que os ministros responsáveis pela floresta, ambiente e energia deviam atuar concertadamente, para viabilizar a valorização da biomassa florestal residual. Se esta fonte de energia endógena e renovável vier a ser aproveitada plenamente, criará empregos geradores de desenvolvimento, e receitas importantes que ajudarão os proprietários florestais a efetuar, periodicamente, limpezas decisivas para diminuir o risco de incêndio florestal. Dívida pública e rigor orçamental não podem impedir salvar vidas e bens, e preservar Portugal! Saberão tais ministros, qual é o valor da biomassa florestal residual? (continua)