Opinião: Brincar com o fogo

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As democracias estão em risco. Os nossos direitos fundamentais nunca estiveram tão expostos. As armas são tecnológicas, aparentemente inofensivas e até contam, em regra, com a nossa condescendência.
Tudo o que vai sabendo faz do famoso “caso Snowden” e da NSA uma quase nota de rodapé.
Já se sabia que da Rússia têm partido os principais ataques cibernéticos contras diversos países europeus. Do mesmo modo, sabe-se que o regime de Putin – acabado de ser reeleito sob um manto de suspeição – esteve na origem da produção massiva de notícias falsas para gerar instabilidade e influenciar os resultados eleitorais nos Estados Unidos, em França, na Catalunha e até no referendo que conduziu ao “Brexit”.
Continuarmos a assobiar para o lado não pode ser a solução. Acharmos que as grandes companhias da internet se vão auto-regular e apresentar soluções efetivas é o mesmo que acreditar no Pai Natal e invocar a liberdade de expressão como “vaca sagrada” para não impor mecanismos de controlo às plataformas digitais é desconhecer que existem igualmente outros direitos fundamentais em crise.
Se dúvidas houvesse sobre a relevância das políticas de proteção de dados e da privacidade basta atentar na notícia que foram roubados 50 milhões de perfis de utilizadores do Facebook e que com base no conhecimento das respetivas preferências, comportamentos e padrões foi montada uma estratégia para a eleição de Trump.
Da China chegam-nos notícias de um projeto do governo assente em Big Data para a criação de um sistema de pontuação social (social score). Ou seja, o cruzamento de informação sobre cada indivíduo para a construção de bases de dados assentes, por exemplo nas tendências de consumo, no nível de endividamento, nas multas e coimas aplicadas e até no círculo de relações duvidosas. À conta de tudo isto, que parece tão simples mas cujo alcance é ilimitado e perverso, está a ser construído um “minority report” que já excluiu, em 2017, o acesso a aviões e comboios a mais de 6 milhões de cidadãos como resultado de baixa pontuação social.
Há nota de que este modelo de “social score” está a ser usado já também em algumas cidades americanas.
Em suma, estamos a viver tempos complexos com a tecnologia colocada no centro das nossas vidas. Se diabolizar seria um erro, desprezar o potencial de perversão e de dano seria de uma ingenuidade inaceitável. Enquanto isso brincamos com o fogo.

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