Opinião: O futuro e os afetos

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Diogo Cabrita

 

Há uma desilusão profunda pelas pessoas que redunda muitas vezes na paixão por animais. Também há uma mudança que acompanha os esvaziamento do entorno humano às vidas comuns. Trabalha-se aqui e ali, muda-se de lugar, não se ganha o suficiente para comprar a casa, adiam-se os filhos. No percurso da solidão apetece um cão, ou um gato.
Depois estamos a falar na ilha deserta para uma cara desenhada ou um coco pintado de rosto. Só que o cão não nos contraria, não nos questiona, não nos recebe de trombas, não tem quezílias no emprego.
Recebe-nos sorrindo. Sorri e conforta-nos. Ser pai de vários e não estar nenhum para nos levar à consulta. Ser o último do nosso curso e não ter filhos. Ser a bolacha última do pacote esquecido na mesa.
Enrugado, seco, carregado da tal peste grisalha entretenho-me com o gato. Os afectos da solidão não se preenchem nas redes sociais nem nas aplicações informáticas.
O calor dos corpos também é nutrição das emoções. Mas os corpos não estão mais. Esta construção de uma sociedade doente trouxe à primeira linha da medicação os anti-depressivos e os ansiolíticos. Nesta elaboração de uma doença do afecto surgem as intolerâncias sobre os animais e sobre o processo relacional entre humanos e outras espécies.
Não investigamos com recurso a animais. Mas investigamos em humanos.
Se não investigarmos não evoluímos. Não sei quem tem razão nem me importa, porque não se trata de a ter, trata-se de integrar uma nova informação e uma nova sociedade onde este cimento vai pertencer às estruturas e às leis.
O contraditório dos socialistas (teóricos, não partidários) é colectivizador e legislador. A bolacha faz doença – proíbe-se. Assim se assemelham ao fanatismo religioso dos que pregam o fim do álcool e o proíbem. Lembrar a Arábia Saudita. Lembrar que em 28 de Outubro de 1919, o Congresso Americano aprovou a Lei de Volstead, sobre o veto do presidente Woodrow Wilson. Claro que se a proibição for escrita por um homem de direita a esquerda é contra. Colocada no poder a esquerda prefere proibir, violar a liberdade a educar, informar e fiscalizar. A fiscalização é um cromossoma que a esquerda recusa com demasiada facilidade. Veja-se esta grotesca lei PAN/Volstead sobre os consumos nos hospitais. Uma terrível violação sobre as liberdades individuais.
Um excesso interpretativo, uma incoerência se permitirem 0,5 de alcoolemia na condução.
O futuro tem de ter a construção do apoio familiar/pessoas, da recusa na concentração de idosos em lares ou cuidados continuados. Os lugares de convívio não devem ser depósitos, não devem ser desligados da origem, do espaço ocupado na comunidade, excepto se por doença. Os idosos serão tantos e tão sós que há uma necessidade de políticas de afecto que podem incluir a utilização de animais e a visita a lugares de relacionamento como restaurantes ou cafés com função social, com apoio específico à integração. São novos espaços, são lugares de estar umas horas com afecto.
Faz mais sentido hospitais com grande especificidade geriátrica que hospitais oncológicos. Há hoje muito mais idosos que doentes oncológicos. O idoso que fractura o membro e é multipatológico deve ser observado por ortopedistas, tratado por eles e equilibado por médicos de geriatria. Estes serviços multidisciplinares não existem. A queda dos idosos e consequente fractura é hoje endémica e é muito mal tratada.
Serve este artigo que repassa o saleiro, o pimenteiro e o galheteiro, para lembrar que são muitos os temas da nova sociedade (circo, alimentação, animais, organização de saúde, etc) que há que meditar e discutir antes de legislar ao sabor de fanáticos e de decisores intolerantes.

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