Ao levantar-me, tropeço e caio. Movimentos forçados de rotação e lateralização na charneira lombo-pélvica. Levanto-me de rompante, vou à casa de banho. A dor era tão intensa que não sei se cheguei a desmaiar, mas o certo é que caio de novo… Quase as mesmas queixas, altamente exacerbadas e, com dificuldade, amparado pela minha mulher, consegui deitar-me.
Acamado, meço a tensão arterial. A máxima estava acima de 20. Decidi internar-me.
Desde sempre, convictamente, dizia que se tivesse algum problema de saúde, em qualquer parte do mundo, onde gostaria de ser tratado era nos Hospitais da Universidade de Coimbra, porque além da qualidade da Medicina, havia e predominavam os afectos.
A escolha era ir para o Serviço de Ortopedia que criei, em Celas, mas sem passar pelas urgências, dado que é voz corrente que as infecções hospitalares são as grandes causas de morte nos Hospitais… Optei, já à noite, perante a intensidade das dores, em vir para uma instituição ou clínica privada, onde prestam serviços de especialidade duas noras.
Só aí é que havia um quarto disponível. Recorro a uma ambulância da Cruz Vermelha. Sou extremamente bem tratado pela equipa, mas todo o trepidar e os solavancos desencadeavam uma dor do grau 5 da minha classificação. Era uma ambulância tão velhinha que não tinha suspensão e há muito que deveria ter sido substituída ou abatida à carga. Estou a ser muito bem tratado e acarinhado… É que, se tivesse ido para o Hospital da Universidade e, eventualmente, operado, estava condenado a ir para uma enfermaria de cirurgia, porque destruíram quase totalmente o Serviço de Ortopedia que, a partir do nada, se criou.
O declínio da Medicina em Coimbra sucede porquê?
Quando fui Director do Hospital (por eleição!) a equipa directiva, da qual constava um enfermeiro, um médico (Director Clínico), um administrador e um engenheiro das instalações e equipamentos, a penúria do Hospital era tão grande que, para fazer um TAC, para Serviço Particular, tinham que se levar os 15 contos à frente, se não, não era feito. Mudámos tudo isso e fizemos a inauguração do Novo Hospital, e aí acrescentou-se à nova Direcção dois elementos da comissão construtora, os Doutores Júlio Reis e Engenheiro Moutinho.
Nesta Direcção, nunca houve partidarice e todas as decisões foram tomadas por unanimidade. Bateu-se o recorde de mudança de um Hospital – apenas em 30 dias! E se tem as valências de Medicina Cardíaca, Neurocirurgia traumática (coluna e cerebral) e até a Litotrícia ultra-sónica… deve-se ao trabalho por nós desenvolvido e ao facto de o Doutor Nogueira de Brito, Presidente da Comissão da Saúde da Assembleia da República, me ter telefonado a pedir para visitar o Hospital.
Ao comunicá-lo à Ministra da Saúde ela disse-me que não o recebesse. Eu disse que nunca recusaria essa visita e que lhe havia telefonado apenas para lhe dar conhecimento. Dada essa visita, depois de serem expostas as carências do Hospital, foi a própria Comissão que impôs a atribuição de 1 milhão e 500 mil contos para o Hospital no Orçamento de Estado, para que pudesse ter a dignidade com que ficou.
Pretenderam alterar a lei da gestão Hospitalar, passando os Directores de eleitos a nomeados. Só três de Lisboa é que concordaram. Os restantes, opuseram-se. Mando uma carta a todos os Directores das Faculdades. O único que respondeu foi o da Faculdade de Economia, a dar apoio, embora antes tenha ouvido a opinião de um membro que veio a ser Presidente da Assembleia Municipal de Coimbra. O conselho deste elemento foi que se tratava de uma guerra dentro do partido.
Daqui tiro a conclusão de que não distinguem o que são princípios de Estado, em que todos devemos estar unidos, e guerrilhas partidárias.
O declínio é tão grande que o Serviço que criei tem sido progressivamente reduzido e os especialistas mais novos do quadro rondarão os 50 anos. Não há renovação….
Que isto constitua um apelo à Comissão de Saúde da Assembleia da República… Um apelo a que venha visitar os Hospitais, particularmente os centrais, pois, por terem passado a ser nomeados os Directores, criou-se a subserviência e a partidarice na ocupação de cargos sem concurso. Mas que a população de Coimbra, através dos jornais, mostre a sua insatisfação, o seu desagrado e, porque não, até, que faça manifestações à porta do Hospital para que acorra a imprensa a registar o desmoronamento do Hospital e Serviços que se situavam entre os melhores na comunidade europeia.
Que a Universidade e a Câmara despertem, deixem-se de partidarice e unam-se para terminar com o caos em que estamos a cair na saúde e não só!…
Primeiro está o país. Só depois as conveniências partidárias e pessoais. E que a imprensa não fique indiferente!…