Opinião: Floresta e Energia (III). Quando haverá uma estratégia para a biomassa florestal?

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Gil Patrão

Os incêndios florestais ocorrem todos os anos, mas, ciclicamente têm havido grandes incêndios, de que se recordam os de 2003 e de 2005, que destruíram cerca de 10% da floresta continental. Só que este ano, esta catástrofe – que não é inevitável – já atingiu dimensões nunca vistas em área ardida, riqueza sumida e tantas, mas tantas, vidas perdidas, pelo que é mais que tempo de Governo e oposição não perderem mais tempo, e acordarem com as forças vivas do país formas de prevenir, de forma consistente e duradoura, o elevado risco de incêndio florestal existente.

Entre outras medidas, é vital que a estratégia florestal contemple a valorização energética de matos, que aceleram a velocidade de propagação dos incêndios florestais e dificultam o ataque aos mesmos. Se as centrais termoelétricas que geram eletricidade com biomassa florestal residual, as centrais de cogeração que produzem com biomassa florestal o vapor para processos industriais e que turbinam o excedente para gerar eletricidade, e as fábricas de “pellets” constituem o eixo base de valorização de despojos florestais resultantes da exploração industrial da floresta, serão as muito mais baratas e bem menores centrais térmicas que, a partir de matos, poderão gerar calor com elevados rendimentos, e serão capazes de o distribuir, por redes domiciliárias de água quente, a aglomerados populacionais adjacentes a zonas florestais.

Subsidiar a entrega de matos nestes centros de valorização energética obrigará a um esforço financeiro avultado, mas os benefícios resultantes de uma limpeza florestal, contínua e capaz, serão muito maiores do que os custos resultantes de apoiar redes de pequenas centrais térmicas que queimem, de forma organizada, este tipo de biomassa, gerada continuamente no nosso país.

Mas, se as empresas que usem biomassa florestal (fábricas de “pellets”, centrais termoelétricas e de cogeração, e outras mais), contribuírem para um Fundo de Limpeza Florestal (FLL), a criar pelo Estado, e se tal FLL vier a ser dotado com uma percentagem ínfima da carga fiscal que impende sobre a venda de combustíveis fósseis – já que a nossa floresta contribui para minorar o aquecimento global, que resulta também da combustão destes combustíveis – o FLL terá meios suficientes para poder subsidiar a entrega de matos em pequenas centrais térmicas, detidas por cooperativas florestais, ou por empresas a que se associem autarquias, agricultores e produtores florestais das zonas rurais, e urbanas, que vierem a ser abrangidas por cada uma destas centrais.

E, se vier a haver entre nós um “cluster” de biomassa florestal, o mesmo criará milhares de empregos indiferenciados e especializados, fixará populações, e revitalizará territórios rurais em abandono acelerado. Não é uma utopia, será a transposição do que há muito fazem países mais evoluídos, e em que o desenvolvimento humano é mais notável. Nada obsta – exceto os grandes interesses instalados em tudo o que é energia – que esta estratégia de desenvolvimento regional seja implementada. Basta, um dia, um qualquer Governo ter coragem de afrontar tais interesses!

A Comissão Europeia apoiou o Centro de Biomassa para a Energia, a que presidi durante muitos anos, para ajudar a definir estratégias endógenas de valorização energética de biomassa. Apesar de todas as ações desenvolvidas, Governos e Autarquias nunca apoiaram a construção de pequenas centrais térmicas alimentadas com matos, nem a implementação de um “cluster” de biomassa florestal. Entretanto, Portugal continua a arder, de forma inglória, ano após ano. O que terá mais de acontecer neste país, para haver uma estratégia para a biomassa florestal?! (Continua)

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