Opinião: De novo a pia de água

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Diogo Cabrita

Há um conjunto de razões gratuitas que nos indignam. Há milhares de pequenos gestos que mudavam muitas coisas mas seriam desnecessários se quem pode exercesse o poder. Faz uns dois anos escrevi sobre uma pia de água num gabinete de cirurgia. A pia se lá esteve fugiu. Pedi a bacia para lavar as mãos há mais de dez anos. Trata-se do lugar onde observamos, diagnosticamos e tratamos doentes na Urgência dos Covões. Foi pensado para ser um bloco periférico. Foi construído com os rigores de um bloco operatório mas nunca o foi. Teve um ventilador que nunca ventilou e retiraram-no. Tem candeeiros de topo. Uma marquesa de grande qualidade. Depois colocaram-lhe computadores e teclados e fizeram ali a observação cirúrgica ao molho. Ali três médicos atendem os que se vão inscrevendo e sendo triados para cirurgia. O ridículo é que não se pode lavar as mãos. Não tem pia de água porque era para ser bloco e nunca foi. Fiz queixa. Pedi intervenção para adequar o espaço há sua real função. Ele é dedo no rabinho (com luva, bem entendido) ele é drenagem de pús ( com kits adequados, obviamente) mas depois de tirar luvas há que empurrar uma cortina, abrir uma porta e percorrer um corredor com frequência cheio de macas para lavar as mãos. Mas porque não há lavatório? Por simples infantilidade da teimosia. Pedi e riram-se. Houve até quem no Conselho de Administração fizesse galhofa. Pedi inúmeras vezes a pia para corrigir maus costumes de gente em formação. Vieram directivas de Lisboa. Veio um inquérito da Ordem. Troquei cartas com o bem-intencionado Carlos Cortes, mas a verdade é que mãos -ninguém lava ali. Houve gente que recuso nomear pela distância que já nos separa que vendeu á Ordem dos Médicos a ideia que era errado porque era um bloco. Mas bloco nunca houve ali. Naquele espaço onde se despendeu uma fortuna para fazer uma sala cirúrgica para eventualidades pode-se colocar uns clisteres, pode-se lavar uma ferida infectada, mas operações nunca tiveram lugar. Lavar as mãos também não. Isto é a ignomínia de uma instituição, é a derrota por cansaço. Isto é o lixo onde se sonhou o luxo. Realmente sofro do mal da indignação e da ferocidade porque bebo desse licor de inutilidade de chefias, bebo essa força da ineficiência e maldade gratuitas há décadas. Quem devia cuidar de gerir quer os seus lugares para receber os seus salários sem incomodidade. São empregos a que não corresponde exercício de função, a que não corresponde trabalho. O Carlos Cortes comeu com uma resposta tola e acatou-a como séria. O problema é que a seriedade tem que ser aferida pois não basta parecer, é preciso provar e dois anos depois não se lavam as mãos ali.

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