Opinião: A Ira de Deus sobre a Europa

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Pedro Mota Curto

J. Rentes de Carvalho é um conceituado escritor que, em 2017, divide o seu tempo entre Amesterdão (Holanda) e Trás-os-Montes (Portugal). Nasceu em 1930, em Vila Nova de Gaia, onde conviveu com a pobreza e a miséria que nesses tempos tanto caracterizava o nosso país.

Detentor de uma personalidade rebelde e inconformada, avessa a injustiças e a hipocrisias, abandonou Portugal por motivos políticos. Viveu no Rio de Janeiro, em Nova Iorque, em Paris e em Amesterdão. Escreveu artigos para jornais e revistas, publicou diversos livros, recebeu vários prémios literários. Nos últimos anos, a sua obra tem estado a ser publicada em Portugal.

Viveu 50 anos na Holanda, entre 1956 e 2006. Só obteve a cidadania holandesa após 40 anos de permanência. Neste país foi professor de Literatura Portuguesa entre 1964 e 1988.

J. Rentes de Carvalho diz o que pensa. Não se preocupa em ser politicamente correto. Quando chegou à Holanda, há cerca de sessenta anos, encontrou um povo que não o seduziu particularmente. Sentiu-se apátrida, infeliz e ostracizado. No entanto, permaneceu. A qualidade de vida que a Holanda lhe proporcionava ia compensando o sentimento de ser rejeitado e oriundo de um país pobre e atrasado. Compensava esse sentimento de inferioridade que lhe era recordado amiúde pelos autóctones, comparando os pantagruélicos jantares de saborosa culinária lusa que oferecia aos amigos, em sua casa, com os jantares que lhe proporcionavam, até em locais conceituados e afamados, onde degustava, quase invariavelmente, duas fatias de pão com margarina, dois croquetes e um copo de leite. J. Rentes de Carvalho afirma sempre ter tido alguma dificuldade em compreender tal ementa, tida como adequada às melhores ocasiões. No limite, ensaiou um enquadramento com a austera religião calvinista.

Em novembro de 2016, foi publicada em Portugal a sua obra “A Ira de Deus sobre a Europa”, onde o autor compara a Holanda que conheceu em 1956 com a Holanda de 2016, concluindo que se tratam de dois países radicalmente diferentes.

J. Rentes de Carvalho tem hoje 86 anos de idade, tendo residido durante 50 anos na Holanda. Conhece muito bem este país e os seus autóctones, tendo igualmente assistido às metamorfoses que a Europa foi sofrendo ao longo das últimas décadas. Amante da liberdade, do progresso e da redução das desigualdades sociais, o autor apresenta neste livro uma visão muito crítica da evolução da Europa, das suas instituições, dos seus políticos, dos seus líderes, das suas hipocrisias, das promessas sempre adiadas, da prevalência do económico sobre o político, do protagonismo do efémero e sensacional sobre o que é consistente e rigoroso.

No século V, o poderoso e faustoso Império Romano, a quem hoje os portugueses ainda tanto devem, soçobrou perante as hordas de bárbaros que avassaladoramente o submergiram. Mil e quinhentos anos depois, J. Rentes de Carvalho parece querer visionar um futuro análogo quer para a Holanda quer para a Europa em geral. A Ira de Deus sobre a Europa?

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