O atual Vereador da Câmara Municipal de Coimbra responsável pelo serviço médico veterinário (vulgo canil e gatil municipais) tem procurado repetidas vezes fazer passar a seguinte mensagem: ele, sim, defende um serviço público para responder às necessidades dos animais e do Povo de Coimbra, enquanto que as associações de proteção animal o que praticam são “chorudos negócios” com “interesses privados”. Porque pessoas menos atentas ou mais distantes desta problemática podem pensar que o homem tem razão, mas sobretudo porque recentemente outros dirigentes do mesmo partido insistiram na tese, vejamos como ela cai pela base.
1. Socorro e tratamento de animais feridos.
O serviço público simplesmente não existe. Experimente o cidadão telefonar para o canil nas horas de expediente dos dias úteis e receberá como resposta “o canil não faz, tente a associação tal ou tal”. Quando muito, poderá ser feita a remoção do animal para o canil/gatil, mas, não sendo tratado, morrerá sem assistência. Vejam-se, nas estatísticas camarárias, as centenas de mortes ditas “naturais” ou “por doença”. Resumindo, naquilo que é uma óbvia política de Cidade e de humanidade básica que é socorrer os animais que sofrem na berma da rua, o Município omite-se e delega todos os dias nas associações e nas clínicas. Pior, estamos a falar de um Município e de um Vereador que foram convidados pela associação a que pertenço – Grupo Gatos Urbanos – a integrar o Fundo de Socorro Animal, a par de outras entidades e empresas. O convite foi feito em Abril de 2015. Até hoje não teve sequer resposta. Choruda indiferença.
2. Esterilização de animais de rua.
O Vereador anunciou há um ano e meio que o Município iria passar a fazer programas de captura, esterilização e devolução de gatos de rua. Com tanta convicção o disse, que anunciou na mesma ocasião não se justificar apoiar as associações que fazem esses programas há anos. Pela leitura do Relatório da CMC de 2015, esta terá feito, nesse ano, 101 animais em 10 locais. Para se ter uma ideia do que os números representam, basta dizer que só o Grupo Gatos Urbanos faz em cada ano que passa sete vezes mais. Talvez por isso, na recente estatística da secretária do Vereador (FB 15/ 10 ), este item desaparece.
Resulta daqui que ao cidadão que quer esterilizar os animais que alimenta e protege junto à sua residência ou local de trabalho não resta outra alternativa que não seja contactar a associação para o fazer, sob pena de essa colónia de gatos aumentar exponencialmente. Dito de outra forma: não há uma oferta de serviço público à altura das necessidades da cidade. Desprezar e romper a cooperação com a associação que mais faz neste campo foi um erro grosseiro. E estupidamente desnecessário.
3. Preços das esterilizações
Sem alternativas no serviço público, as associações como a minha – sem fins lucrativos – estabeleceram acordos com clínicas veterinárias que são empresas privadas com fins lucrativos. Os preços das esterilizações de gatas/os que estas clínicas praticam diferem pouco entre si e são 75% abaixo do valor de mercado. Ou seja, esterilizam 4 animais pelo preço de um. Isto só é possível porque, claro, o preço de mercado está demasiado elevado, mas também porque os médicos, enfermeiros e restante pessoal dessas clínicas oferecem o seu trabalho durante as horas em que operam animais de rua. Leram bem: oferecem. Calculem agora o que estes profissionais pensariam se lessem os disparates do Vereador.
Claro que um serviço público de autêntica proteção animal poderia fazer preços ainda melhores, acelerar o processo de esterilização dos animais de rua, apoiar muitos donos carenciados cujos animais, não sendo esterilizados, vão produzir inúmeros filhotes para a rua. Mas, para isso, tem que querer e saber cooperar com as associações e não ter preconceitos contra os privados, nem inveja das associações. Direi mesmo: tem que mudar de titulares.
4. Adoções de animais
A única bandeira do atual serviço municipal que parece ter alguma credibilidade é a do número de animais adotados. Aí sim, houve aumento e progresso em relação a mandatos anteriores, com resultados que parecem tender a estabilizar-se na casa dos 600/ano ( 435 em 2011 ). Porém, mesmo aqui há um elemento perturbador. A prática de esterilizar animais de muito tenra idade, contra a grande maioria das opiniões da comunidade científica, tem vindo a revelar-se muito danosa para os pequenos animais que adoecem facilmente e para os adotantes que vão depois a correr para as clínicas a tentar salvá-los. Percebe-se a vontade de entregar o animal já esterilizado. Mas não que se insista numa prática que tem custado a vida a muitos animais e milhares de euros aos seus adotantes. São mortes e despesas que não constam das estatísticas municipais, porque os pequenitos vão adoecer e morrer longe. Mas o dogmatismo desta prática pode vir a comprometer o próprio progresso das adoções que se saúda como positivo. Os adotantes falam uns com os outros.
CONCLUSÕES: Se o leitor é uma pessoa interessada no progresso das políticas de Cidade, designadamente para com os animais que connosco partilham o espaço urbano, peço tão só que reflita nos dados e informações que apresentei e se mobilize para exigir uma melhoria real nos próximos anos. Há condições para isso.
Se, ao contrário, Você entende que tudo o que o Vereador e o canil fazem é bom porque é dos nossos e quem disser o contrário é porque quer negócios chorudos, desejo-lhe uma vida cheia de certezas e um bom ano de 2017.
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