Fico preocupado ao ter conhecimento que as salas de operações das Urgências (duas) feitas, por nossa intervenção, após visitar o hospital, em construção integrado na gerência dos HUC, não existirem. Eu, que tinha ajudado a pôr a funcionar, num mês, a urgência do Hospital Miguel Bombarda, em Moçambique, construída há seis anos, conjuntamente com o director clínico do Hospital Miguel Bombarda, dr. Cruchinho.
Esta urgência foi a melhor urgência que vi em toda a minha vida pois tinha 4 salas de operações, capacidade para 120 doentes, 25 quartos para médicos, sala de refeições, biblioteca, Raio X…
Mostrei a minha preocupação e perplexidade. Estava ali localizada a morgue. Fomos atendidos, construíram-se as salas. Funcionaram e estão hoje encerradas. Penso que foi um erro, para não lhes chamar crime e, passo a fundamentar a minha posição com o meu passado com dois colaboradores em Lourenço Marques. Estando de urgência e tutelando a Ortopedia e a Cirurgia aparecem simultaneamente, no gabinete de chefe de equipa e interrogam-me: “Qual é o mais urgente? Uma apendicite aguda ou uma fratura exposta?”.
Sobe no elevador, uma colega e diz: “acaba de entrar um indivíduo que levou uma facada no coração”.
Estava resolvida a contenda. O mais urgente é este.
Era um latagão, não reagia, mas salvou-se e até foi o ortopedista que a correr foi buscar o sangue para lhe dar.
Tanto a fratura exposta, como a apendicite aguda – ambas são urgentes e é difícil tomar uma decisão já que há que atender ao estado do doente, à idade e ao tempo decorrido. Uma fratura exposta, por exemplo, até às 4, máximo 6 horas, considera-se que não há contaminação nem infecção. A partir das 8 horas, já deve considerar-se como possível, a infecção. Na apendicite aguda, passado esse tempo pode haver uma peritonite; hoje com os antibióticos já estamos mais descansados, mas se não dispusermos deles?
Com as salas de urgência logo ao lado, poder-se-ia salvar o doente da facada, mas hoje à espera do elevador, do cirurgião e do anestesista será que se teria salvo?
Mas o mais gravoso é a possibilidade de infecção num bloco exaustivamente utilizado, o central, onde agora se faz a urgência em que uma equipa fica à espera que termine a outra, com o não arejamento e esterilização das salas. Li recentemente num jornal e foi notícia da televisão que 20 por cento das mortes (+ ou -) era por infeções ganhas no hospital. Li, também, recentemente, na imprensa, o número elevado de cheques emitidos no hospital para os doentes serem operados fora do hospital. No serviço de que fui criador e director, que tinha 15 salas de operações, 350 doentes e tinha 7 mil doentes em lista de espera, e, claramente ficava entre os maiores e melhores serviços europeus, no número de camas e qualidade; tive conhecimento recente, que um ortopedista pode só vir a operar uma ou duas vezes por mês; que o ortopedista pertencente ao quadro, mais novo, estará próximo dos 50 anos. Fecharam ou não deixaram abrir salas de operações. E um dos iluminados directores que me sucedeu diz que a lotação deverá ser 120 camas. É assim que transferiram a secção de Tumores para junto da Ginecologia no Hospital Central e fecharam também a Ortopedia 1 com 3 salas de operações. E, até, queriam deixar ir para Lisboa o Banco de Conservação de Tecidos e Órgãos ali localizado. Não fora a dr.ª Ana Calvão da Silva, e isso teria acontecido. Nem respeitavam a memória do Professor Ferrer Correia e o muito que deve o hospital à Fundação Gulbenkian.
Recentemente, fizeram, em Lisboa, uma homenagem aos 30 anos da Fertilização In Vitro (Medicina de Reprodução) quando dois anos antes já tinha sido feita em Coimbra pelo Professor Agostinho de Almeida Santos e a sua equipa! Ninguém repôs a verdade. É assim que queremos tirar Coimbra da agonia em que se encontra? (continua).