Opinião – No essencial, a Europa, do medo à Esperança

Posted by
Spread the love
José Manuel Pureza

                         José Manuel Pureza

Não foi preciso o brexit para que a complementaridade entre medo e ódio ocupasse o espaço dominante na política europeia. Há muito que é assim. O centrismo mistura-se com ortodoxia e geram uma Europa que, para supostamente lutar contra a extrema direita, aceita jogar o seu jogo, faz sua a agenda da discriminação de estrangeiros e imigrantes, torna-se campeã dos cortes nos direitos sociais e nos serviços públicos, tudo para ir a votos e disputar um eleitorado cada vez mais exasperado.
Sobre esse eleitorado cai, de um lado, a metralha do ódio e, do outro, os obuses do medo. De um lado, mobilizam-se as massas com promessas de limpeza étnica e com acenos de regresso nostálgico a um passado de segurança e prosperidade que, na verdade, nunca existiu. Do outro, fixa-se eleitorado brandindo com o medo: o medo de mudar – porque nos habituámos a ver que só se muda para pior – o medo de ficarmos atolados numa crise que nos dilacera, o medo de arriscar e perder (como se, não arriscando, ganhássemos alguma coisa…).
Foi desse eleitorado e dessa combinação entre o ódio e o medo que se alimentou o referendo na Grã Bretanha. A alternativa ao xenófobo “Britain first” foi o medo de sair da União Europeia e de cair num poço sem fundo. E a origem de todo o processo foi uma habilidade trapaceira de James Cameron que, para aparecer na fotografia como europeísta, conseguiu dos burocratas sem alma nem coluna vertebral de Bruxelas que, a vencer o remain, a Grã Bretanha aumentaria exponencialmente o seu já amplíssimo regime de exceção, desta vez traduzido em discriminação dos direitos sociais dos imigrantes e blindagem dos privilégios da alta finança da City. O pior da política europeia esteve em estado puro no referendo britânico.
Tivesse o sim à permanência, partilhado por tanta gente de dentro e de fora da Grã Bretanha, sido realmente alternativo ao brexit xenófobo e estaríamos agora obviamente diante de uma exigência imparável de acolhimento dos refugiados e dos imigrantes. Mas não. Os mesmos estadistas e líderes europeus que rasgaram as vestes ontem com a vitória da xenofobia de Farage foram os que construíram muros para impedir a entrada de refugiados nos seus países e assinaram o acordo da vergonha com a Turquia para travar a vinda de imigrantes e requerente de proteção internacional para essa Europa tão cheia de pergaminhos humanistas.
À aliança entre o ódio e o medo que domina hoje a política da Europa, urge contrapor a aliança entre a democracia e a esperança. É por aí que passa a única alternativa digna desse nome.

Leave a Reply

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

*

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.