Opinião – Um dia… porque há sempre um dia!

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Luís Santarino

Luís Santarino

Se alguém tem dúvidas que caminhar até Fátima é difícil, não há como testar as suas capacidades. Se alguém tem dúvidas que a grande maioria o faz por fé, que se atreva.

Confesso a minha fraqueza, de homem de pouca fé que, levado por uma intempestiva vontade de perceber porque é que tanta gente se aventura, também me aventurei.

Com um grupo de gente de fé, confesso que é mais fácil. Não tão fácil para mim, que fiquei na Redinha por incomportáveis dores por tudo o que era corpo. As dezenas de quilómetros de preparação que fiz, a andar a pé e até a correr não foram suficientes para me preparar condignamente.

Na verdade, eu – pecador me confesso – com mais uma malta da minha geração, e apesar de educados para a prática religiosa, não resistíamos, em altura de peregrinação, em mandar umas bocas aos peregrinos.

– Há muita falta de mão de obra, muitos vasos para descarregar para as festas da Rainha Santa – vejam que até fomos duplamente garotos – vão trabalhar malandros, era o que, diga-se, de pior se dizia.

Pode levar tempo a perceber as motivações das pessoas. Mas na verdade, há sempre um tempo em que as percebemos e que nos arrependemos do que fizemos. Mas, azares dos azares, o arrependimento não corrige o mal feito, só obriga que modifiquemos as nossas atitudes.

Lembro-me de, nesse dia, ter passado por uma velhinha em grande velocidade. Ela seguia em passo lento. Muito lento mesmo. Lenço e chapéu preto na cabeça, aliás toda de negro vestida, com uma pequena mochila nas costas, em profundo recolhimento. Que “bem” terá recebido para tamanho sacrifício?

Ainda hoje quando vejo passar os peregrinos a sua imagem não me sai da cabeça. E ainda bem, porque é uma imagem que guardo, que respeito e, de quando em vez, me recorda e ensina. É uma imagem que me acompanha, porque a sua serenidade é contagiante e motivadora.

Um dia comentei este episódio com um amigo de longa data. Católico, Apostólico, Romano. Homem de fé e de boas práticas.

“Vê lá tu pah, que eu, agnóstico militante, tentei ir a pé a Fátima e só consegui chegar à Redinha”. Ó meu caro amigo, retorquiu; em primeiro lugar, pensas tu que és agnóstico”, e, em segundo lugar, a tua promessa está cumprida. Sentiste que terias de ir, tentaste e foste até onde te foi humanamente possível.

Confesso que fiquei um misto de irritado e tranquilo, pois contava que me iria dizer que teria de tentar de novo. Promessa é promessa e tem de se cumprir. Mas não.

Hoje, quando vejo os milhares de peregrinos a caminho sinto uma enorme vontade de os seguir. Principalmente, porque gostaria de encontrar a tal velhinha, de passo curto, pausado e certo que lá chegou e eu não consegui.

Telefonei a alguém para me ir buscar depois de já ter descansado um bom bocado com presuntos a bailar por cima da minha cabeça.

Entrei no carro. Passados uns quilómetros na viagem de regresso a Coimbra, lá vinha a velhinha, de passo curto, pausado e certo. É que, desta vez eu iria com ela, passo curto, pausado e certo, porque era a receita para lá chegar.

Podemos encontrar uma lição de vida nos mais ínfimos pormenores, sem nos dar conta do que nos está a acontecer. “Obrigou-me” a corrigir processos, procedimentos e até comportamentos.

Com muita, pouca, ou nenhuma fé, proponho-vos que arrisquem.

O que vão aprender supera em muito o esforço que se faz.

Cá por mim, vou ter de fazer o resto do caminho. Um dia…porque há sempre um dia!

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