Não sei há quantos anos que sonho com a torre sineira do Mosteiro de Santa Cruz.
Queria ver a bela torre a destacar-se no casario, queria ouvir o som dos seus sinos, como que a voz da parte baixa da cidade, queria ir lá acima mexer naquele bronze de tantos séculos.
Mas, desta vez, foi diferente. Sonhei que a torre ia ser erguida, de novo, no seu local primitivo. Sonhei com o acordo das entidades eclesiásticas, académicas e autárquicas, o entusiasmo das associações amigas de Coimbra, a aprovação pelos organismos competentes da tutela e com uma verba conseguida capaz de suportar a reconstrução. Apoios de organismos internacionais, para uma área património imaterial da humanidade, verbas de empresas e amigos de Coimbra, estes situados nas mais diversas paragens, além de uma excelente comparticipação local. Aquela frase que li já não sei onde “ninguém deixa Coimbra”, parece ser mesmo verdadeira.
No projeto, a construção maciça em forma de paralelepípedo que suporta o compartimento dos sinos e que corresponde a um edifício de cinco ou seis andares com mais de vinte metros de frente, no meu sonho, era destinado, dentre outras valências, a uma Casa da Música Sacra.
Um renovar da projeção da Escola de Coimbra na história da música portuguesa, desde o medieval ao renascentista, centrada sobretudo no Mosteiro de Santa Cruz, fundado em 1131.
A existência da torre sineira tornará aquela parte de Coimbra mais autêntica. É como se puzessemos o filme a rodar ao contrário, naquela sequência de imagens que marcaram a minha memória, com a torre a cair.
Às vezes pergunto a mim próprio se o arrepio que sinto quando leio sobre as destruições de monumentos ancestrais, não foi também sentido pelos nossos antepassados de Coimbra.
Que cidade nós teríamos sem os tornados devastadores que a assolaram da alta à baixa!
Que tempo imenso necessitámos para começarmos a perceber que, apesar de tudo, ainda há muito a recuperar e que o conseguiremos se nos unirmos!
Que melhor homenagem podemos prestar ao extraordinário património que é o Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra, amputado e vilipendiado ao longo dos séculos, do que reconstruir uma das suas partes mais emblemáticas, a sua torre sineira!
Gostaria que o meu sonho vos atingisse também e que fosse possível, daqui a algum tempo, admirar a torre sineira do claustro da Igreja de Santa Cruz, como o fizeram os monges crúzios, durante séculos e séculos.