Os últimos dias têm sido marcados por uma tentativa patética de desfazer o resultado registado nas urnas de voto.
De facto, as eleições de 4 de Outubro passado ditaram uma derrota fragorosa do anterior governo, que foi expressa pela perda de um número elevado de votos do PSD e do CDS, que mostraram o repúdio de uma política com que estes partidos nos empobreceram. Entretanto, venderam bens públicos contra a vontade popular. É o que agora procuram continuar, ultrapassando os limites constitucionais de um governo de gestão, já que caiu há dias com os votos da maioria eleita.
Nada disso é justificado pela história portuguesa, em que “Segundo refere o cronista Fernão Lopes, o Mestre de Avis, ainda Regedor e Defensor do Reino, criou em Lisboa a Casa dos Vinte e Quatro, ou junta dos doze ofícios, onde cada um deles estava representado por dois delegados. Outras cidades, como Coimbra, Porto, Santarém, Évora, tiveram a sua Casa dos Vinte e Quatro.”1
Nesse tempo, ainda embrionário da democracia portuguesa, afirmava-se a vontade popular de independência nacional através dos homens dos doze ofícios que, juntos, expressavam com veemência e energia a vontade nacional, então traída por uma aristocracia então vendida ao estrangeiro. A Revolução de 1383 foi assim a saída necessária para uma situação de empobrecimento e de perda de independência nacional. O mesmo aconteceu em 1640 e sempre foi o povo que disse o que queria, negando aos chefes ao serviço do estrangeiro o Poder. E sempre estes tentaram conservá-lo contra a sua vontade.
É isto que explica o nosso continuado atraso cultural e científico ao longo dos séculos e nas nossas vidas, mantendo nós sempre uma enorme e sufocante incapacidade de ultrapassar obstáculos de entendimento do que nos manietam.
São os “interesses agora ocultos” que fazem com que os poderosos, que ficaram definitivamente precários após as eleições de 4 de Outubro, como resultado de uma moção de rejeição, que até aceitaram como legítima, venham estapafurdiamente propor revisões constitucionais de forma inconstitucional.
Só isso explica que tenham decidido acabar de vender a TAP, algo que prosseguem há muito. Assim como tenham encarregado de vender o Novo Banco um antigo secretário de estado que tinha falhado a venda da TAP. Presumimos assim que esta gente só quer vender os bens nacionais a uns amigos. E o prejuízo ficará sempre para o Povo. É o que antevemos em tudo o que está para acontecer.
Como todos já temos a nossa sobredose de sofrimento, devemos dizer não a esta contínua degradação da nossa vida coletiva, cuja situação é aberrante por ser a continuidade daquilo que o Povo repudiou e quis acabar há mais de mês e meio.
1 António Matoso e Antonino Henriques – Formação Corporativa: Ensino Técnico, Livraria Sá da Costa, Lisboa, 1958, pp. 38-39