Os contratos colectivos de trabalho consagrados na Constituição têm sido instrumentos poderosos na defesa de direitos dos trabalhadores.
Negociados entre os representantes dos trabalhadores, os sindicatos, e os representantes das entidades patronais, os contratos colectivos têm consagrado direitos mais favoráveis aos trabalhadores que os globalmente definidos na legislação laboral, designadamente ao nível das condições de trabalho e dos próprios salários.
Os trabalhadores, cientes do poder deste instrumento, defendem-no. Mas as próprias associações empresariais afirmam que a contratação colectiva pode ser útil, reconhecendo a importância da melhoria de condições salariais para o aumento da procura interna e o relançamento da economia.
O governo conhece bem o poder da contratação colectiva. Há muito que são usados mecanismos de caducidade e de sobrevigência dos contratos ou a não publicação de portarias de extensão. Eliminar a contratação colectiva é um objectivo ideológico do governo. Nesta, como em outras matérias, a subordinação aos desígnios da troika tem sido o grande pretexto para se imporem medidas mais profundas motivadas por uma necessidade de ajuste de contas com a história. Os senhores do governo e dos partidos que o suporta não conseguem conviver com o que resultou do 25 de Abril. A Constituição da República, os direitos que desta emanam, conquistas civilizacionais profundamente marcantes, incomodam esta clique empenhada num ajuste revanchista com a história. Se a ocasião é favorável, então toca a rever o que o 25 de Abril construiu. È o exercício do tal ajuste de contas, um estilo “chegou finalmente a oportunidade e o tempo certo”, um “ora toma, que já vos tramamos!”.
Em 2009, eram cerca de um milhão e 300 mil os trabalhadores abrangidos por contratos colectivos de trabalho. Em 2013, os trabalhadores abrangidos por instrumentos de regulação colectiva de trabalho são apenas 186 mil.
O actual governo por proposta legislativa pretende agora liquidar o mecanismo da contratação colectiva, reduzindo drasticamente os seus prazos de caducidade e de sobrevivência, acelerando o seu término. Quanto mais rapidamente cessarem os contratos colectivos, mais rapidamente baixam os salários dos trabalhadores e se extinguem vários direitos regulamentados.
Num período de grave crise social, com perda de rendimentos por parte de sectores significativos da população, dos reformados e pensionistas, dos funcionários públicos, dos trabalhadores em geral, dos menos qualificados aos quadros técnicos de topo, com a emigração em massa a reviver décadas passadas e com toda a falta de horizontes resultante de imposições da troika e de posições dos partidos dos governos, a consciência para a defesa de direitos deverá, ou deveria, ser muito maior.
Direitos conquistados não são prémios ou regalias. Os direitos laborais são pilares constituintes da dignidade do trabalhador e da dignificação do trabalho.
Afinal, como no poema de Niemoller, habitualmente atribuído a Brecht, primeiro levaram os comunistas, depois os sindicalistas, de seguida os católicos e nunca era nada comigo, até que me levaram a mim. E já era tarde.