Opinião – A minha ida ao 25 de Abril

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Fernando Serrasqueiro

Fernando Serrasqueiro

A pergunta é clássica e repetitiva. No entanto, nunca me tinha sido colocada. Resta a memória pós 40 anos. Fica a minha comemoração. Onde estava no 25 de Abril? Costumo dizer, fui lá ver como foi. Foi um dos períodos mais marcantes de quem o presenciou. Terá condicionado, seguramente, a minha vida futura. Fez nascer um impulso por uma intervenção cívica mais ativa. Foi o convite para algo que estava em projeto. Mas vamos lá ao melhor da história. A 24 partimos para Lisboa. Acompanhava alunos numa visita de estudo que organizei. Era professor na Escola Comercial após ter terminado a licenciatura, meses atrás. Depois do jantar e digestão feita, seguimos até sítio de referência na altura. O Cacau da Ribeira, na Av. 24 de Julho, fazia terminar a noite com algum aconchego. Vi já vários militares em veículos, mas a minha ignorância nesta matéria presumia treinos. Ainda estava sem ter sido incorporado para a guerra. Surgem rumores. Consistentes. Prolongo a noite. Responsável pelos alunos, troco a cama por um banco na Rodoviária. Era aí a concentração e havia que decidir o que fazer. Sabia já que havia algo em marcha. A dúvida existia. Era a repressão da brigada do reumático sobre o golpe frustrado das Caldas? Ou o completar do que ficou a meio? As condições levam-nos a decidir regressar a Castelo Branco. Alguns alunos já não conseguiram transporte e ficaram com as famílias, onde haviam pernoitado. Viagem atribulada e longa, com desvios impostos. Sem telemóveis, sem tv, restava a rádio do autocarro. Insuficiente. Foram várias paragens para comunicar com a família e saber notícias. Desencontradas. Chegamos tarde, mas os rostos de quem nos esperava indiciavam primavera. Afinal, a excursão foi ao 25 de Abril e foi isso que ficou na memória para podermos contar. Dizer “estive lá!”
Valeu a pena!
Para quem, como eu, viveu o antes e o depois da Revolução bastou-me a alegria da mudança. Liberdade. Hoje pode parecer pouco, na época era o erguer do sol até então encoberto. Guerra. Perseguições. Fugas. Clandestinidade. Opressão. Mortes. Partido único. Repressão. Eleições fraudulentas. País isolado. Dificuldades. Pobreza. Atraso. Vivemos num ambiente bem diferente, apesar da vida dura dos últimos tempos. Temos agora ameaças, condicionamentos e retrocessos. Importa resistir. Somos nação livre e democrática. Temos nas mãos o nosso destino, fruto duma revolução, original e sem mortes. Lembro-me de, poucos meses antes da data histórica, ter ido ao parlamento pela primeira vez. Discutia-se a presença de Portugal em África com forças militares. Hoje, escrevo no mesmo local. As guerras são outras. Em Abril. Sem militares.
Foi só há 40 anos!

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