A renegociação da dívida de Portugal está na ordem do dia. Não por só agora ter surgido esta proposta ou reivindicação. Mas como proposta central no âmbito de um Manifesto subscrito por cerca de setenta personalidades e agora tornado público.
Há muito que o PCP defende a renegociação da dívida. Há muito que o PCP afirma que não se promove o desenvolvimento, nem se dá resposta aos problemas financeiros e sociais com o actual serviço da dívida. Só em juros da dívida pública, estamos a pagar mais de 7 mil milhões de euros por ano, o equivalente ao que gastamos com a saúde! O PCP foi a primeira força política a tomar posição pública sobre este assunto. O serviço da dívida é insustentável e uma política de relançamento da economia exige a sua renegociação nos seus prazos, juros e montantes.
Amplos sectores da sociedade portuguesa acabam por convergir relativamente à necessidade de renegociação da dívida externa.
E também mais uma vez, há quem recorde a história e os seus exemplos. A 27 de Fevereiro de 1953 subscreveram-se os Acordos de Londres. Então, em 1953,a Alemanha já tinha beneficiado da injecção de fundos provenientes do Plano Marshall. A potência que movida pelo nazismo destruíra grande parte da Europa e do Mundo, cometendo crimes brutais contra a humanidade, tinha acumulado, tanto antes, como depois da guerra, uma enorme dívida externa, junto de mais de 70 países. O país derrotado não colhia naturalmente qualquer especial simpatia por parte das nações europeias e mesmo dos Estados Unidos, vítimas do pesadelo e da barbárie nazi. A Alemanha do início dos anos 50 encontrava-se endividada, a sua economia em ruínas e sem qualquer credibilidade.
Os Acordos de Londres de 1953, não propriamente devido a intenções humanitárias e de clemência, antes movidos por interesses políticos, económicos e geoestratégicos, permitiram tirar a Alemanha da crise. A troika então era constituída pelos principais credores da Alemanha, os EUA, o Reino Unido e a França.
As negociações não foram fáceis. O mundo, os vencedores da guerra e os principais decisores políticos, tinham sem dúvida bem presentes as consequências do tratado de Versalhes, no final da I Guerra Mundial. Na declaração de Londres, os EUA, o Reino Unido e a França garantiram a solvabilidade alemã e uma solução adequada para a sua dívida, tendo em conta a resolução rápida dos problemas económicos da Alemanha.
A troika de então aceitou uma redução do valor da dívida externa alemã de 62,6%., estabeleceu regras favoráveis para o pagamento do valor que ficou em falta, a pagar em marcos com os juros a níveis abaixo do mercado, e sempre no pressuposto de que o serviço de dívida se adaptasse, a todo o momento, à capacidade da economia alemã para fazer face à sua própria dívida. Foi estabelecida uma regra de ouro, nunca violada, a limitação da amortização anual da dívida e de juros a 5% do valor das exportações do país. A dívida externa alemã foi perdoada em 46% e a posterior à II Guerra em 51,2%. Do remanescente, 17% ficaram a juro zero e 38% a juro de 2,5%. Os juros devidos desde 1934 foram igualmente perdoados. Foi também acordado um período de carência de cinco anos.
A Alemanha duplicou o valor do PIB entre 1953 e 1963 e conseguiu, antes do tempo previsto, pagar toda a dívida não perdoada.
È também possível a renegociação da dívida portuguesa. Vários outros exemplos existem na história, mesmo na mais recente.
O PCP há muito que o defende. A justeza desta posição não depende da sua aceitação por todos. A recente descoberta da sua necessidade por mais uns quantos, confirma, de novo, que as propostas do PCP defendem os interesses nacionais e o povo português.