Opinião – Livros escolares penhorados pelas Finanças

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24 Paulo Almeida CAPA

Paulo Almeida

Se tivesse de eleger uma despesa para ficar isenta de cortes estatais, escolheria a educação. Porquê? Porque são as pessoas que definem Portugal.

Cá dentro e lá fora, pois o seu saber não conhece fronteiras. Nem o que sabem fazer. Tudo o que temos neste rectângulo de terra e ilhas é feito por alguém. Alguém que sabe. E que sabe fazer. Muitos também sabem ensinar. Sempre que se diminui a despesa, ou dito de outra forma, se reduz o investimento no ensino e investigação, está-se a desistir mais um pouco deste país, da matéria humana que edifica a sua soberania. Portugal, para ser competitivo neste mercado global, precisa de gente ensinada. Já agora, a falar português.

Neste mês em que os trabalhadores dependentes têm de entregar a sua Declaração de Rendimentos, recordei-me de uma mulher que há tempos, muito aflita, veio ao meu encontro por causa do seu filho de 12 anos de idade. O miúdo tinha recebido uma notificação! Não era do DIAP, nem do Tribunal. Bem pior. A Autoridade Tributária escreveu ao rapaz, notificando-o para explicar por que razão não tinha declarado rendimentos quando ainda só tinha 8 anos de idade. Deu-lhe 10 dias para o fazer, com expressa referência para indicar o nome e número de contribuinte do cônjuge.

A senhora achou por bem ir falar com o Serviço de Finanças, tendo-lhe sido dito, sem grandes explicações, que o melhor seria pagar. Disse-me que só ouvia o verbo “pagar, pagar, pagar”, até à exaustão. Ninguém lhe conseguiu explicar o envio da carta ao miúdo. Parece que só tomaram atenção quando lhes foi perguntado se iriam penhorar os lápis, a mochila e os livros escolares do rapazito. Solução: foi remetida nova carta, desta vez à mãe em representação do menor.

A senhora viu-se assim forçada a ter de responder por escrito, informando o que a Autoridade Tributária já sabia ou deveria saber. Que o valor de pensão de alimentos que a contribuinte mãe tinha inscrito na sua declaração de rendimentos, onde também consta o menor como dependente, era o mesmo valor que as Finanças queriam que um rapaz de 12 anos de idade declarasse como seu rendimento quando tinha somente 8.

Espero sinceramente que todos os menores não emancipados e integrados num agregado familiar tenham sido defendidos quando receberam idêntica notificação. Vindo da Autoridade Tributária já nada espanta. Nem quero arriscar que a motivação seja a de cumprir metas e objectivos, cada vez mais difíceis. Lembro por isso duas necessidades: a de investir na educação de todos e numa reforma do Estado que simplifique e reduza os procedimentos. E ainda prazos curtos para deferimentos tácitos. É que há mais de 1 ano que o rapaz e sua mãe esperam uma resposta, ainda com receio que um dia as Finanças venham penhorar as sebentas universitárias do jovem que quando era miúdo recebeu uma notificação das Finanças.

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