Opinião – La Dolce Vita

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Paulo Almeida DRPaulo Almeida

O Movimento Cinco Estrelas de Beppe Grillo obteve 25% dos votos nas últimas eleições italianas, enquanto que Mario Monti quedou-se pelos 10%. O anti-herói italiano derrotou o herói e tecnocrata de Bruxelas. Os italianos votaram em quem afirma ser melhor representado por uma mulher, mãe de três filhos e com dificuldades para os alimentar a todos, do que por políticos profissionais, que deseja ver fora da cena parlamentar.

Soaram de imediato os alarmes nos quatro cantos do mundo, Itália incluída. O “New York Times”, por exemplo, escreveu que o cenário de coligação instável irá expôr a Itália à turbulência dos mercados. O “Wall Street Journal” avançou que a votação caótica italiana poderá abalar os mercados mundiais. Em resultado, o risco da terceira maior economia da Europa aumentou 40 pontos, para os 335. Por arrasto, o de Espanha escalou dos 361 para os 412 pontos. As declarações dos políticos (de toda a Europa) não se fizeram esperar, balançando entre as ameaças misturadas com receio e o apelo ao bom senso das forças políticas. Basta ler o “La Repubblica” e o “La Stampa” para perceber o temor: expressões como “alerta vermelho” e “Italianos não são a Grécia, são um membro do G-8 e um membro-chave da união monetária. O euro não pode permitir um cenário como o grego, seria uma janela de instabilidade excessiva”, foram usadas nos jornais.

Por seu lado, Beppe Grillo, fiel ao seu “programa”, já anunciou que não fará qualquer coligação. Veremos se as outras regras anunciadas em campanha se mantêm ou não: ninguém pode ser censurado; ninguém pode fazer mais do que duas legislaturas; todos têm de recusar pensões e pagamentos de despesas oficiais; em último lugar, o movimento não pode ser transformado em partido político. A aversão aos partidos é de tal ordem, que Beppe Grillo ambiciona os 100% de votos para acabar com eles.

Inacreditavelmente, os responsáveis políticos preferiram colocar quase sempre a culpa no povo italiano por ter votado em Beppe Grillo (e também em Berlusconi). Como se a culpa não fosse deles! Mais do que a austeridade e dívida pública, preocupa-me a fragilidade da classe política e das instituições. Os partidos e os que os governam continuam sem nada fazer para convencer as populações da bondade das suas acções. E depois admiram-se que não votem neles ou que nem votem de todo. Pior, alijam a sua culpa, atirando-a para cima de quem votou “mal” ou não exerceu o direito de votar. Bem ou mal, o movimento de Beppe Grillo fez primárias para escolher os candidatos e seria capaz de não rejeitar em Portugal um debate sobre alterações de leis eleitorais, tema sobre o qual poucos falam. Seria preferível que os políticos começassem a fazer-se entender, pois o debate em Portugal assemelha-se à cena inicial do filme “La Dolce Vita”. Espero muito sinceramente que o resto da película não se “repita”. Sozinho, o Tiririca brasileiro já desistiu, mas este Beppe Grillo pode ter vindo para ficar.

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