Opinião – Apontamentos revolucionários

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GONÇALO CAPITÃO

Gonçalo Capitão

A interpretação que faço das funções públicas que, com honra, aceitei impediu-me sempre e continuará a impedir-me de comentar a situação da África do Sul. O mesmo recato acalentarei, por maioria de razão, em relação à Venezuela, que agora me acolhe.

Todavia, quero deixar-vos um aroma daquilo que são impressões que nem uma semana de maturação ainda levam, e que julgo não beliscarem o pudor alardeado supra.

A começar, repito uma nota que registei em Joanesburgo: Caracas, sendo uma cidade perigosa para os padrões de segurança portugueses (bem mais que aquela megalópole africana), não é o inferno que pintam na Europa. Pode sair-se à rua nas zonas que verdadeiramente interessam ao visitante, desde que se use de uma ferramenta muitas vezes negligenciado pelos turistas: bom senso e singeleza. Assim preparados, podemos apreciar alguns monumentos, saborear uma deliciosa gastronomia em bons restaurantes e apreciar a boa disposição dos locais.

Depois, embora se não tenha, evidentemente, tido ainda a oportunidade de sair da capital, fica já a suspeita confirmada por prova testemunhal de que se trata de um país repleto de belezas naturais. Nem de outro modo se entende que, ao invés de outras comunidades portuguesas da diáspora, para os portugueses e luso-descendentes aqui residentes este seja “o melhor país do Mundo”, sendo assaz alta a taxa de aquisição da dupla nacionalidade.

Acresce que – sem comentários pessoais que a mim mesmo vedo – aqui está a acontecer História.

O regime vigente é, evidentemente, polémico. Porém, há que resistir à visão radicalmente eurocêntrica e perceber que, para lá de todas as dúvidas de índole democrática, estão resultados concretos que dão apoio social efectivo à “Revolução Bolivariana”.

Desde logo, o enorme aumento da taxa de escolarização que passou, ao que percebo, para números próximos da universalidade.

Em segundo lugar, embora a qualidade, ao que se diz, não cumpra os padrões europeus, a generalização dos cuidados de saúde é outra bandeira orgulhosamente hasteada pelos apoiantes da continuidade.

Em terceiro lugar, concretizaram-se três outros pilares essenciais de um socialismo que se preze: aumento das prestações sociais (em valor e espectro), incremento da habitação social e início da reforma agrária.

Depois, surge o combate ao desemprego, mormente por via cooperativa; a mesma que, aliás, permite colmatar muitas brechas e prover a muitas situações de emergência social.

Se a isto somarmos uma sólida política de alianças internacionais, facilmente perceberemos que algo se passa por cá e que há bem mais do que ruído político.

Contudo, fica uma dúvida a terminar: sendo a fonte de toda esta vida o petróleo, que papel ficará, feitas as contas no futuro, para a “economia real”?

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