Opinião – A espiral do silêncio

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BRUNO PAIXÃO opiniaão recorteBruno Paixão

Numa tarde, há uns anos, rumei a Lisboa para participar num jantar que me disseram ser “restrito”. Ao telefone, haviam-me adiantado que discutiríamos as razões para a contínua perda de eleitorado de um determinado líder político.

Aparentemente, a sua popularidade continuava intacta e a sua energia não dava mostras de esmorecer. Por que motivo andava tão inquieto o seu núcleo duro? Pelo caminho fui refletindo. Após zapping mental, foi ficando claro que o candidato já não gozava da complacência dos media como outrora. Em consequência, as suas bases de apoio emudeciam, apareciam cada vez menos e, de certa maneira, uma ausência vazia e desabitada começava a abater-se sobre a candidatura. E isso podia ser o início do fim. O ponto de não retorno. Talvez por essa razão ele tenha enfatizado várias vezes durante um debate televisivo que estava convicto da sua reeleição (nenhum político assume que vai perder, mesmo que os dados o desmintam). O candidato dava mostras de estar preocupado com o silêncio dos apoiantes.

Há uma teoria da comunicação que ajuda a compreender isto. A socióloga alemã Elisabeth Noelle-Neumann chamou-lhe Espiral do Silêncio, ao observar que, durante as campanhas eleitorais, as pessoas que recusavam a corrente dominante e mais apoiada, acabavam a dada altura por se subtrair ao silêncio. Esta posição de recuo fazia com que os maioritários parecessem maiores do que realmente eram e que os minoritários parecessem menores.

Não vou discutir as fragilidades da teoria de Noelle-Neumann quando confrontada com a Mudança Estrutural da Esfera Pública, de Jurgen Habermas. Aqui importa substanciar que as pessoas ficam mais isoladas e tendem a retrair-se quando se sentem em minoria. Por muito senhores-do-nosso-nariz que sejamos, decerto já terá acontecido alguma vez, uma única que seja, contermos o nosso desacordo, por percebermos que estamos inexoravelmente sós. Porém, às vezes, essa sensação é falsa. A comunicação hoje consegue induzir nas pessoas realidades artificiais que as condicionam nas suas orientações. Que lhes sussurra ao ouvido, lhes agarra na mão e as leva a votar de determinada maneira. Que as senta num sofá e lhes diz como é o mundo para lá da sua janela. Alguns políticos, recorrendo aos media, procuram motivar as suas bases fazendo passar a mensagem de que vencerão as eleições. Isto porque temem que a espiral do silêncio se abata sobre os seus apoiantes e os amarre à clausura no momento em que o seu voto é preciso.

Resta contar que o candidato perdeu as eleições. Já não conseguiu travar a tempo a espiral de silêncio que pairava sobre o ânimo prostrado dos seus apoiantes.

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