Joaquim Valente
Nos países europeus a concertação social é prática usual e indiscutível, envolvendo governo e parceiros sociais quer sejam as confederações sindicais e patronais ou representações dos conselhos económicos e sociais.
Portugal criou em 1984 o Conselho Permanente da Concertação Social que foi extinto em 1992 e substituído pela Comissão Permanente da Concertação Social órgão, do Conselho Económico e Social (CES) consagrado na Constituição da República Portuguesa, logo com legitimidade jurídica e que por sua vez entre outras funções, tem a da concertação social no domínio das políticas económica e social, embora sejam funções consultivas para a definição das estratégias de desenvolvimento do país.
A concertação social é indispensável para o alargamento e aprofundamento do diálogo social, aproximando interesses e posições eventualmente antagónicas, numa base de cooperação, e o governo deve assumir a função de defesa do bem comum e do interesse geral, contribuindo para a normalização e estabilização das relações sociais.
Na concertação social há um conjunto de princípios orientadores, nomeadamente o direito à dignidade da pessoa humana a que se associa o direito ao trabalho condigno, e o direito ao descanso e a uma remuneração justa, e nesta linha de princípios considera-se que o trabalho não deve ser encarado como uma mera mercadoria, que se autorregula.
A concertação social está presente na doutrina social da Igreja, que defende o seguinte: “o trabalho é um bem de todos, que deve estar disponível para aqueles que são capazes de trabalhar, e numa sociedade em que o direito ao trabalho seja atenuado ou sistematicamente negado, e na qual as medidas de política económica não consintam aos trabalhadores níveis satisfatórios de emprego, não pode conseguir nem a sua legitimação ética, nem a paz social”.
Em Janeiro do último ano, foi assinado em sede de concertação social “o compromisso para o Crescimento, a Competitividade e o Emprego” defendendo-se que o crescimento económico resulta de um aumento da competitividade da economia portuguesa, sendo o trabalho factor de desenvolvimento, mas ao mesmo tempo desvalorizou-se esse trabalho. O acordo para o crescimento económico não quantificou metas de crescimento do produto e do emprego e no atual quadro de medidas extremas de austeridade tem tido efeitos muito recessivos ao nível da economia.
Com o aumento do tempo de trabalho, e com a diminuição dos seus custos unitários pretendia-se aumentar a produtividade nacional com a competitividade externa das empresas portuguesas, medidas isoladas que agravaram ainda mais a recessão económica e a instabilidade social aumentando exponencialmente o desemprego, e ao mesmo tempo diminuíram as remunerações reais e os subsídios de desemprego.
Reduzir só a isto o desenvolvimento económico é uma visão estreita da situação real do país, pois a competitividade depende essencialmente da eficiência na gestão dos recursos humanos, das capacidades e eficiência dos gestores, do acesso das empresas a condições de financiamento, e da motivação dos trabalhadores. Na actual conjuntura, romper com a concertação social, sendo o Governo o primeiro a fazê-lo, é algo de incompreensível e sobretudo um risco económico e social com consequências imprevisíveis.
Perante as últimas medidas anunciadas pelo Governo que poderiam levar à completa ruptura das negociações, os deputados da maioria apressaram-se a anunciar que iriam tentar melhorar o projecto de lei elaborado pelo seu Governo. Esperemos que os resultados sejam positivos, para o interesse nacional, e que o diálogo não seja interrompido por decisão unilateral.