Mário Nunes
Dia de Nossa Senhora da Assunção. Este feriado fugiu à insensibilidade e dever histórico de alguns políticos, daqueles que falam, apenas, em números. Aqueles que encontraram nos feriados do 5 de Outubro e do 1.º de Dezembro os motivos de somenos importância para os eliminar. Felizmente, o dia 15 de Agosto manteve a tradição e fez cumprir o calendário. Houve um lampejo de luminosidade nas cabeças pensante.
Aproveitámos a “boleia” da data e após o almoço (estamos de férias), com o sol a convidar ao passeio, esquecendo a noite de chuva que amaciou os terrenos sequiosos e revigorou as árvores e plantas limpando o pó de muitos dias, encetámos o trajeto mentalmente elaborado. Sem vivalma pelo caminho escolhido, subimos, calmamente, o ziguezague pitoresco que conduz ao Monte do Calvário.
Beneficiámos das sombras que se “espreguiçavam” pelo pavimento onde caminhávamos e chegámos ao sítio da capela da Senhora da Piedade e de Santo António, onde mora, também, a Rainha Santa. Partilhámos o percurso dos devotos que satisfazem as suas promessas, quantos subindo o caminho de joelhos.
Parámos e elevámos o pensamento para os santos da nossa devoção. Depois, voltados para o lado oposto do templo, admirámos a soberba paisagem que se espraia perante os nossos olhos. Em frente e no sopé a Vila do Espinhal, ao longe o Monte de Vez, sentinela e fronteira do horizonte próximo que a nossa vista alcança.
Do lado direito, a Vila de Penela, e à esquerda o lugar do Trilho, as Chãs de Santo Estêvão e os Penedos da Relvas. No espaço limitado por estas “paredes” físicas, a grandeza do ubérrimo vale que derrama a pujança produtiva das suas terras, vale “violado” pela auto-estrada do pinhal interior, em construção. Além do Monte de Vez divizamos o redondo das montanhas, cuja curvatura nos testemunha a esfericidade da Terra.
A quietude aliada à beleza proporcionou o rejuvenescimento do organismo e a riqueza do espírito. A ligação do terreno, o efémero, ao universo, à intemporalidade. Um cenário deslumbrante que torna o homem uma partícula quase invisível perante a imensidão do Cosmo. “Descemos” do céu à terra, atravessámos o recinto do profano e religioso, que conduz às três cruzes de pedra, símbolos do Calvário e que o toponizam, acrescido da morte e sofrimento humanos.
Sentados no degrau da cruz central que figura a crucifixão de Cristo, envolvemos o pensamento na profundidade e valor que este símbolo representa para os cristãos. Lugar místico onde culminam as Vias-Sacras na Quaresma e, outrora, o encerramento da procissão da Semana Santa. Um sítio propício à reflexão e ao usufruto da beleza natural.
O silêncio revigorante foi quebrado, apenas, pelo latido de um cão, pelo cantar rítmico das cigarras e pela passagem de duas rolas. A paz do nosso ego, intuitivamente, transportou-nos para o palco da guerra, das injustiças, ódios e vinganças que escravizam, matam e desumanizam o homem, fomentando milhões de desgraçados.
Sustentados nestes pensamentos iniciámos o regresso pelo percurso da Lapa. Anotámos, mentalmente, as espécies de árvores que ladeiam o caminho, entrámos na estrada nacional que conduz à Praia da Louçainha e chegámos à monumental igreja da Vila do Espinhal. E, terminámos a caminhada no café Marujo. Aqui, redigimos esta crónica no dia do feriado que não sofreu, ainda, o “apagão” dos políticos e da Igreja.
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