A Siscog, criada em 1986, foi a primeira empresa portuguesa a exportar software. Que dificuldades encontrou na altura?
As dificuldades foram muitas. Em Portugal olha-se sempre com alguma desconfiança para aquilo que é feito cá. Portanto, foi difícil fazer acreditar as empresas portuguesas numa empresa tecnológica nacional. Por outro lado, nomeadamente na Europa, Portugal era visto como um país de emigrantes, que exportava mão de obra, e portanto fazer acreditar às empresas europeias que era possível fazer software de qualidade em Portugal foi um desafio interessante. Os caminhos de ferro holandeses foram o nosso primeiro cliente internacional.
Em que consistem as soluções informáticas da Siscog?
Dado o normativo laboral da empresa e as restrições do trabalho das pessoas, o sistema faz a especificação do trabalho dos funcionários para um período longo – um ano ou meio ano. Consiste em dizer quais são os serviços que cada tripulante vai fazer, ao mais pequeno detalhe das tarefas que faz ao longo do dia, de forma a que as pessoas saibam exatamente o que fazer em cada dia de trabalho.
Ou seja, é uma forma eficaz e eficiente de gerir os recursos humanos.
Exatamente. São sistemas de apoio à decisão que permite dar diferentes tipos de apoio a um planeador humano. E também pode ser operado de forma automática: carrega-se num botão e o sistema toma todas as decisões.
Como é que descobriram o mercado dos transportes ferroviários?
Começámos por organizar seminários para despertar o interesse por esta tecnologia. Ao princípio ninguém se interessou, mas resolvemos (em parceria com uma outra empresa) lançar uns protótipos grátis, só para demonstrar a viabilidade da nossa tecnologia, e surgiram duas oportunidades- o Banco Nacional Ultramarino, que nos pediu uma solução para apoiar o excesso de tesouraria, e a TAP, para o planeamento dos tripulantes. Mas nenhum deles foi para a frente (por razões alheias à qualidade dos sistemas). Contudo, foi uma experiência válida, porque permitiu-nos ver as capacidades desta tecnologia e, depois, constituiu um protótipo para podermos mostrar a outras empresas. Foi assim que começámos a ir para estrangeiro.
Em 1997 e em 2003, a Siscog recebeu o prémio de inovação da Associação Americana para a Inteligência Artificial.
O primeiro prémio foi atribuído a um projeto que fizemos para os caminhos de ferro holandeses e o segundo para os congéneres noruegueses. Tenho muita pena que o primeiro não tivesse sido atribuído à CP, porque foi o resultado de um trabalho que fizemos para a CP, que não foi para a frente.
A internacionalização continua?
Sim. Abrimos um escritório no Porto, como experiência-piloto para a abertura de escritórios no estrangeiro. Estamos a fazer um grande esforço para sairmos da Europa, dando os primeiros passos nos Estados Unidos e no Brasil. Também andamos a namorar a China e estamos a abordar a Índia.
Tem um método de trabalho de gestão de recursos humanos invulgar em Portugal.
Damos alguma liberdade de horário, e isso também motiva os colaboradores a pertencerem mais à organização. Mas, por outro lado, temos um grau de exigência elevado. Temos ganho alguns prémios, também, nessa área. Neste momento, temos quase 100 pessoas e temos estado a recrutar pessoal. Estamos numa curva de crescimento contínuo, faturamos seis milhões de euros/ano. Acho que estamos a fugir à crise porque, praticamente, só exportamos.
Sente-se mais empresário, professor universitário ou investigador?
Não me via a ser apenas um professor universitário porque gosto de testar e pôr em prática as teorias que desenvolvo e aprendo. Por outro lado, também não gostaria de estar desligado da universidade, que é um ponto de excelência para a criatividade, inovação e investigação.
A manutenção da fábrica de descasque de arroz Ernesto Morgado é uma homenagem ao seu pai?
É uma homenagem aos meus antepassados. A empresa foi fundada em 1920 pelo meu avô. Hoje (55 trabalhadores) fatura entre 15 a 20 milhões de euros/ano. Grande parte da matéria-prima é do vale do Mondego. (…) Lançámos uma linha de produtos de valor acrescentado. Primeiro a gama gourmet, com a marca “Pato Real”, e depois uma segunda, que tem tido muito sucesso porque o arroz que fica pronto em dois minutos. Queria provar a mim próprio que a inovação não se faz só nas novas tecnologias, mas também num produto básico como o arroz.
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