Inssureição anunciada

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Francisco Queirós

Foi há trinta anos. 12 de fevereiro de 1982. Dia de greve geral convocada pela CGTP, sem a adesão da UGT. Era então ministro da Administração Interna a figura que hoje todos identificam como um super gestor, padrinho político do atual primeiro ministro e de outras gratas ou desgraçadas figuras do partido maioritário do governo e “expert” em questões de segurança e defesa nacionais ou internacionais.

Ângelo Correia, no rescaldo da greve, anunciaria ao país um cenário de potencial insurreição social. Uma sublevação ou revolta nacional, secretamente planeada pelos sindicatos, que nunca tendo existido serviu para amedrontar os incautos e os tolos. A famosa “insurreição dos pregos” marcou para sempre o currículo do político e o anedotário nacional.
22 de março de 2012 – Greve Geral. Também, como há trinta anos, a UGT ficou do lado do governo e do grande patronato. Dois ou três dias depois da greve, os jornais divulgam publicamente um relatório dos Serviços de Informação de Segurança (SIS) – serviços secretos que elaboram relatórios secretos rapidamente tornados públicos. O relatório que o SIS terá elaborado e remetido ao governo antevia para o dia da Greve Geral um cenário de graves distúrbios, ruas bloqueadas ou ocupadas por grevistas, arruaceiros e quejandos. A alteração da ordem pública em larga escala incluiria o arremesso de “cocktails molotov”. O estado de insurreição generalizado terá sido assim antevisto pelos espiões nacionais e comunicado como séria advertência ao governo e poucos dias depois com toda a leviandade aos jornais.
E o que aconteceu no dia 22 de março? Alguns incidentes na Baixa de Lisboa com manifestantes alheios ao movimento sindical. Por todo o país reinou a calma, apenas alguns pequenos incidentes que não configuram, de perto ou de longe, qualquer plano de insurreição ou de simples alteração da propalada “ordem pública”. Pelo contrário, os incidentes ocorridos foram como os verificados na madrugada de 22 em Coimbra junto aos serviços municipalizados de transportes em que dois motoristas enraivecidos arremessaram, não cocktails molotov, mas os autocarros para cima do piquete de greve, felizmente sem provocarem ferimentos de maior.
A greve foi, como sempre, uma enorme demonstração de protesto popular, no quadro do exercício de direitos constitucionais, e extremamente pacífica.
Então que dizer do relatório do SIS? Como se torna público um relatório secreto dos serviços secretos? Que cenário era aquele? O caos anunciado resulta da enorme incompetência do SIS? Uns escuteiros armados em Mata-Hari? Ou os serviços são tão competentes que fabricam à peça cenários com propósitos políticos determinados?
É longa a literatura, relatos de ex-espiões, peças jornalísticas diversas a propósito de serviços e agentes secretos que em vários países em fases de intensificação da agitação social se infiltram em organizações “anarquistas” ou as fomentam para criarem situações de enorme instabilidade e de desordem pública, à margem dos genuínos protestos sindicais e populares, com a finalidade de virarem as opiniões públicas, confundidas, e as populações contra os que protestam. Procurando colocar a maioria da opinião pública ao lado dos governos, clamando por mais ordem e repressão.
Mas afinal tudo isto são histórias de espiões! Insurreições de pregos e de cocktails – só bagaço que os tempos não dão para mojito ou Bloody Mary – a quem servem?

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