No aproveitar está o ganho

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Aires Antunes Diniz

No final do passado mês de Outubro realizou-se em Coimbra um Congresso Luso-Brasileiro de História da Ciência que teve elevada qualidade. O único senão foi ter sido frequentado por pouca gente. Comemorava os Cem Anos da Reforma Republicana da Faculdade de Ciências, que era o culminar da luta de gerações de estudantes e professores, que queriam transformar a Universidade e o País. Queriam romper com a trágica tradição que gerara “Adriano Machado, (que) em Economia Política, admirava Proud’hon e em doses homeopáticas e constitucionais propinava-o aos discípulos”. E assim um homem ficou célebre sem ter escrito coisa que perdurasse e assim ficaram como ele muitos catedráticos de Coimbra”. 1

Ocorreu este congresso num momento de crise financeira, o que, infelizmente, torna os governantes incapazes de pensar como aproveitar o que se vai fazendo de bom.

E explico porquê: desde há mais de seis anos que sucessivos governos elegeram como alvo principal das suas poupanças orçamentais os professores. Têm-no feito da forma mais desastrada pois fizeram partir os professores mais qualificados e desaproveitaram jovens qualificados com vocação para o ensino.

De facto, ao sobrecarregarem os professores com uma componente não lectiva, em que quase nada de útil se faz, conseguiram “poupar” uns lugares de professores ao conseguirem deixar de pagar reuniões equiparadas a tempo lectivo ou apoios lectivos, que são na verdade aulas. Entretanto, deixou de haver formação de professores e foi-lhes retirado o dever/direito de se actualizarem usando oito dias de dispensa para frequência e participação em congressos. Claro que os professores sem qualificação nem desejos de a ter ficaram felizes. Só se sentiram prejudicados os professores mais briosos/ambiciosos científica e academicamente.

Para ver o desperdício que é tudo isto, vi no México, em S. Luís de Potosi, como o International Standing Conference for the History of Education (ISCHE 33), onde participei, estava cheio de mexicanos desejosos de aprender e participar, havendo muitos apoiados pela Secretaria da Educação Pública. Eram uns quarenta e tomavam zelosamente apontamentos de tudo. Era isso que o nosso Ministério da Educação devia fazer, aproveitando os congressos para trazer para o ensino mais criatividade e mais contemporaneidade competitiva. Mas, para que isso acontecesse era preciso que tivesse um pensamento estratégico para o ensino público. Infelizmente só tem uma máquina de calcular limitada: só faz subtracções, transformando-se assim o crítico da educação no problema que antes pretendia resolver.

De facto, manietado por uma lógica sufocante não se vislumbra na entrevista dada recentemente por Nuno Crato uma ideia com futuro. Por isso, o futuro não passa por aquilo que nos quer impor.

1 Joaquim Madureira – Caras amigas – Gente Limpa. Antiga Casa Bertrand, Lisboa, 1909, p. 112

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